GOLPE BAIXO
Maria Muller
 
 

Qual seria o maior golpe baixo que alguém poderia dar em alguém? Tirar-lhe a mulher? Todo o seu dinheiro? A sua casa, a sua família, seus bens materiais, sua moral, seu trabalho? Sua saúde ou sua vida?

É difícil escolher entre estes um que seja pior do que o outro. Todos são baixíssimos e duríssimos e causariam ao desafortunado uma enorme perda, danos irreparáveis e tristeza profunda.

No entanto, lidamos todos os dias com estas coisas nos noticiários e até já nos acostumamos a elas. Nem reparamos mais e não lhes damos a atenção devida; continuamos a comer se estávamos a comer, a conversar, ou a rir…

É horrível pensar assim, mas isso é o que acontece mesmo todos os dias, mundo afora.

Então, se eu for contar um golpe baixo que sofri, qualquer um, por pior que seja, não vai surpreender ninguém, e será apenas mais uma historinha triste a ser contada.

E aí? Nada tem mais interesse? Nada nos surpreende mais? É isso? Tudo já aconteceu, tudo já foi dito e assunto encerrado?

É assim, até que alguma coisa aconteça conosco e viramos então o protagonista de um destes golpes terríveis, como por exemplo, um falso sequestro. Até que entremos em contacto com a suposta vítima e nos certifiquemos da sua segurança, quanto desespero e quanto sofrimento teremos passado, quanto horror!

Pois é. Foi isso mesmo que aconteceu com a Glória. Ela é uma pessoa incrível, trabalhadeira, honesta, e deu um duro danado para criar o seu único filho, motivo de orgulho e imensas alegrias. Ele é a própria razão da sua vida.

Depois de terminado o curso superior com enorme êxito, Felipe foi premiado com uma bolsa de estudos na melhor universidade de SP, a USP, para um mestrado. Assim, deixou sua cidade natal e sua queridíssima mãe, e dirigiu-se a grande metrópole para continuar os estudos.

Logo na primeira noite de sua ausência, Glória recebe um telefonema, altas madrugadas, dizendo que seu filho havia sido sequestrado, etc e tal, tendo os bandidos conseguido informações preciosas durante as várias horas que a mantiveram ocupada nas duas linhas telefônicas: de casa e do celular , em total desespero.

Porém, têm coisas que não têm muitas explicações e acontecem quando menos esperamos; e foi o que sucedeu: lembrou-se do celular da empregada e pedindo um tempo aos bandidos para tomar um remédio, acordou-a e ligou para seu irmão que é da PF.Ele, por sua vez, conseguiu o número de um vizinho de seu filho em SP, que gentilmente foi até o apartamento ao lado e BINGO! Felipe dormia solto o sono dos justos….

Ate’que a coitada da Glória entendesse que o que estava acontecendo era um “falso sequestro”, muitas horas de desespero e muitas lágrimas e principalmente muitas orações ela já tinha feito, e que Graças a Deus, seu filho se encontrava bem e com saúde em SP.

Tinha sido “só” mais um falso sequestro, que tantas e tantas vezes noticiam nos jornais e na TV, e que nós não damos atenção….

Só a coitada da Gloria sabe os maus momentos que passou, mais ninguém!

E só à ela interessa a sua triste história?

Não sei, pois se pudermos evitar que outras pessoas caiam no mesmo “golpe”, terá valido a pena contá-la. Se com ela pudermos salvar a noite de um único alguém, solitário, preocupado com um filho, ou uma filha que estuda ou trabalha a noite, então terá valido a pena.

E que se danem os outros, cada dia mais insensíveis com a desgraça alheia.