A FESTA
Elói Pereira de Melo
 
 

Mandou fazer um terno azul-marinho, recomendou ao alfaiate que escolhesse um tecido nobre, pois seria uma ocasião especial, queria ser admirado por todos.

Pediu que a esposa fizesse um vestido novo, colorido cheio de flores que ressaltassem a primavera. Que colocasse colar, anel, e brincos novos com pedras preciosas que brilhassem com o luar.

Às filhas, que fossem no comercio mais próximo do lugarejo e comprassem roupas e sapatos, arrumassem os cabelos e colocassem flores. Trouxessem água de cheiro, que exalasse o perfume do campo, pois queria que a noite fosse única, ficaria para ser lembrada por gerações.

Aos filhos chamou-os e disse: vocês têm me dado muita alegria, as lavouras estão limpas, e livre das pragas. As cercas reformadas, as pastagens exibem o mais verde das últimas décadas. O gado, e demais animais, desfilam com saúde exuberante em frente da casa. A perfeita harmonia com o meio.

Temos um motivo especial para comemorar. Afinal são anos de trabalho árduo, é um bom momento para comemorar, e resgatar a alegria, dar início a um novo ciclo com fartura, aproveitar o pouco tempo de vida que me resta..

Recomendou que gastassem parte das economias, que os homens estariam liberados para comprarem botas novas, que cobrissem o joelho, com pequenos cadarços amarrados ao lado, montarias novas com argolas de prata que brilhassem como as estrelas.

Os cavalos deveriam ter as ferraduras trocadas, os cascos aparados, e banhadas no regato, as crinas penteadas, que fossem os cavalos mais lindos da redondeza.

Queria a família reunida naquela noite não para olhar como se fosse a última vez como Remingway, mas como um momento que marcaria a união da família.

No pequeno povoado não se falava em outra coisa, as pessoas aguardavam com ansiedade, seria um acontecimento inédito, em um lugar tão pacato, onde eventos, só quando algum circo de passagem pela cidade, trazia um pouco de risos.

Formou-se uma correria e um aquecimento no pequeno comercio, que ficava há algumas léguas. As pessoas vendiam animais, parte do mantimento que seria para atravessar o ano, pois a próxima colheita estava longe, e com o dinheiro compravam roupas, calçados, acessórios de beleza disponíveis nos armazéns.

No tão esperado dia, lua saiu mais cedo para iluminar o caminho. Carroças saiam lotadas, gente a pé a cavalo, as ruas coloridas sem precedentes.

Todos os moradores foram convidados, exceto uma família. Eram inimigos ,há muito tempo, por conflitos de terras. Havia promessas recíprocas, de que quando se encontrassem, se fosse durante o dia anoiteceria com a fumaça de pólvora, e se à noite, ocorreria um eclípse.

A festa animada as pessoas dançando, veio uma orquestra de fora, os músicos pareciam pingüins, o homem estava lindo como nunca, a pele avermelhada, o cabelo e o bigode grisalhos, reuniu a família para uma foto, e disse que faria a declaração, o que causou a expectativa de todos.

Ouviu-se o primeiro tiro, o terno azul perfurado, um corpo estirado ao chão de uma das salas principais, e os filhos espalhados por outras partes da casa.