O VELHO E O FREVO
Valéria Vanda de Xavier Nunes
 
 

É isso mesmo! Como está bem claro no samba feito pelo meu irmão em homenagem ao nosso inesquecível pai, ele morreu sim. O nosso velho foi embora. Só ficou conosco a saudade, esse vazio no peito que todos nós seus filhos carregamos. A saudade e também o amor ao carnaval. Estes dois sentimentos continuam e continuarão sempre, enquanto restar um único ser vivo que carregue em suas veias esse sangue quente - que não se conforma em ouvir o barulho de uma orquestra de frevo e ficar parado no chão - o sangue de seu "Lourivá". Nunca vamos nos esquecer de papai e sempre lembramos dele principalmente quando se aproxima a época do carnaval. Claro que nossos carnavais sempre serão lembrados, independente das raivas e tristezas que sempre nos acompanhavam nestes quatro dias. Por que sabemos e lembramos muito bem, que a alegria destes dias era sempre acompanhada de muita raiva devido aos "constrangimentos" pelos quais passávamos por causa dos seus arroubos carnavalescos, de suas trapalhadas, de suas inconveniências quando bebia demais. Todavia, como a alegria do frevo está entranhada em nós; em nossos cinco sentidos, assim como está entranhada em nosso corpo, em nossos pés, em nossa alma - ela falava mais alto, então, não seriam essas trapalhadas, essas inconveniências que iriam tirar a nossa alegria nos dias de Momo. Mesmo passando por tudo que passávamos, não deixávamos de nos contagiar e cair na folia, deixando a tristeza de lado, pois, mesmo que muitas vezes os nossos corações estivessem tristes, o nosso sangue e os nossos pés pediam para marcar o passo no compasso do frevo. Lá íamos nós, levados pela mão de papai pelas ruas centrais de Bezerros onde ele dava um jeito de armar uma grande roda, nos colocava no meio e fazia com que "marcássemos o passo" nem que fosse na "marra" para que todos que estivessem ao redor nos vissem. Jesus, aquilo às vezes se tornava uma verdadeira "tortura". Mas era assim, era assim mesmo, desta maneira, que ele se sentia feliz. Era assim que ele alimentava as suas ilusões, como bem disse o nosso irmão. Era assim mesmo o nosso pai. Movido a alegria, a boemia, procurando sempre motivos para continuar sua jornada, a fim de tornar a vida mais fácil de ser vivida, e pra conseguir isso, muitas vezes se utilizava da nossa velha conhecida: a "bebida", na doce ilusão de que a vida é "sempre uma festa", mas, como diz o samba: "quando tudo findava era grande a tristeza, acabava a alegria e botava o pé no chão." O nosso velho morreu.... Mas, enquanto houver um Xavier vivo, eu lhes garanto, que a folia de Momo jamais morrerá.