MULHER DE VERDADE
Patrícia da Fonseca
 
 

Quando o Paulo Ricardo foi contratado, a Mari pensou que fosse enlouquecer de tesão. Ela e toda a mulherada da empresa. Pudera. No meio de tanto homem feio, o P. R., como ficou conhecido, era simplesmente um deus grego. Alto, loiro, musculatura definida e entendia de matemática; era auxiliar de contabilidade do doutor Rogério, o contador de cara fechada da empresa. Mas para tristeza de todas, o P. R. não deu bola para ninguém. Chegava no horário, cumprimentava os colegas, saía para almoçar com eles e encerrava o expediente ignorando as investidas das moças. Mari não se conformava. Não era do tipo que podia suportar aquilo quieta. Sempre teve os homens que quis. Como que P. R. se atrevia a ignorá-la totalmente?

- Tenho duas teorias – filosofou uma colega para Mari, em um dia de lamentações – Ou ele é apaixonado pela namorada ou é gay.

- Não, gay não! – quase gritou a Mari, sentada na sua cadeira de recepcionista – Se ele não gostar de mulheres, como que eu fico?

- Você não acha que ele se dá muito bem com o doutor Rogério? – perguntou a outra, com um sorriso maldoso.

- Será?…

A colega foi embora, deixando a semente da dúvida na cabeça da Mari.

Alguns dias depois desta conversa, uma outra recepcionista foi contratada para auxiliar a Mari no atendimento aos clientes. Era uma mulata bonita, com os lábios sempre vermelhos, cabelo liso até o meio das costas. Mari sentiu o perigo. Como que P. R. reagiria perante uma musa daquelas?

A resposta veio rápida. Quando o rapaz voltou do almoço, deu de cara com ela. Ambos cruzaram os olhares e ele se demorou um pouco mais naqueles olhos negros sedutores.

- Oi, Fernanda. Tudo bem?

Mari se arrepiou. Eles já se conheciam! Fernanda, com sua provocante minissaia, miou:

- Boa tarde, Paulo Ricardo. Quer dizer que somos colegas, então?

- Parece que sim – disse ele, encaminhando-se para o elevador – Boa tarde.

- Para você também – respondeu ela, cravando seu olhar na bunda do P. R. e só soltando o ar quando a porta do elevador se fechou.

Mari estava com o coração pulsando. Ali tinha coisa. Envolvimento recente, a julgar pela reação de Fernanda, que pegou um documento e passou a se abanar, espalhafatosamente.

- Queima Senhor! Não é que tirei a sorte grande? O Paulo Ricardo aqui! Meu colega!

- Você… já conhece…

- Claro – respondeu Fernanda, altiva – Ficamos duas ou três vezes – e baixando o tom de voz, ela cochichou para Mari – Ele beija muuiiiito! É um amante e tanto.

- Ufa! – Mari suspirou, aliviada – Ele não é gay.

- O que você disse?

- Então vocês já ficaram? ­– Mari perguntou, rapidamente.

- Sim. Quer dizer, ele que quis ficar comigo. Ele tem esta pose toda, mas é um enorme de um pegador.

Mari sentiu uma pequena decepção. Pegador. Que expressão baixa. Então o P. R. era assim… Bem, devia ser mesmo para ficar com alguém do nível da Fernanda. E, empolgada, Fernanda prosseguiu:

- Ele é um expert nas artes de… bem, você sabe. Que interessante trabalhar no mesmo lugar que o Paulo Ricardo. Acho que me darei bem aqui. Escuta, Mari. Ele trabalha com quem mesmo?

- Com o doutor Rogério, que é o contador da empresa e um dos braços direitos do nosso patrão – explicou ela, pensando seriamente em pedir para trabalhar em outro lugar – O P. R. é auxiliar dele.

- Uau! Quer dizer que nosso amigo está bonito na foto, hein? – e novamente baixando o tom de voz, ela segredou – Bonito ele fica sem roupa.

- Ah é? – perguntou Mari, com náuseas – Imagino que ele deve estar falando para todo mundo lá em cima que já pegou você um monte de vezes.

- Não fala, não. Ao contrário de mim, o Paulo Ricardo é muuiiiito discreto.

Durante o resto da tarde, Mari teve que suportar a Fernanda falando dos atributos de P. R. Falou tanto que meia hora antes de terminar o expediente, a Mari já estava no RH, implorando para ser deslocada para outra seção. Quando Mari estava no ponto, esperando seu ônibus para voltar para casa, deparou-se com Fernanda e P. R. conversando na esquina. Mas ela não se importou. Seus apelos deram certo. No dia seguinte passaria a trabalhar na Seção de Contabilidade. E aí, pensou Mari, arquitetando maldades na sua mente, o P. R. finalmente iria saber o que significava a expressão “mulher de verdade”.