A ROSA
Vivian de Moraes
 
 

Dilma estava cansada naquele dia, que era um dia qualquer, tão aborrecido e arrastado quanto qualquer outro no seu emprego que não lhe dava nenhum prazer. Mas algo em especial a chateava naquele dia: a rosa.

De manhã, antes de ir trabalhar, passou na casa do Norma, sua melhor amiga e vizinha, e viu sobre um aparador uma única rosa num vaso solitário, mas uma rosa vermelha, viçosa e insinuante, que perfumava todo o ambiente e o tornava um tanto romântico.

Ficou confusa: não lembrava que Norma aniversariava ou que fosse alguma data especial. E não era. Norma explicou: "O Adílson me deu ontem à noite, quando voltou do trabalho". Um presente de marido carinhoso, sem data nem motivo que fosse o amor conjugal. Dilma disfarçou o contrangimento e foi à farmácia.

Lá, o dia passava especialmente irritante, com clientes chatos e o gerente de mau humor. Depois de um dia perdido, foi para casa, onde fitava o marido, Alisson, assistindo à tevê.

Que se passaria por aquela cabeça de homem? Tentava lembrar-se de quando ele lhe fizera um único agrado. Ah, havia muito tempo, mas uma vez, uma vez sim, quando as crianças ainda eram pequenas, ele lhe comprou uma rosa de um ambulante. Não uma rosa de floricultura, linda como a de Norma, e sim uma rosa meio murcha que, apesar disso, não deixou de ter um grande significado. Depois daquele dia, ele vinha com os presentes regulamentares: aniversário, Dia das mães, Natal; às vezes, aniversário de casamento. Mas sempre um presente previamente pedido, muitas vezes coisas para casa, nada que tivesse a delicadeza de uma única rosa vermelha.

Depois daquele dia, Dilma passava as tardes na farmácia sonhando com uma rosa, com um casamento feliz, com novos dias. Queria que Alisson fosse mais atencioso, que se amassem mais, que se apaixonassem como no início, que Alisson a agradasse, e que pudesse cuidar dele.

Um ano depois, as filhas foram para a faculdade, e Dilma entrou em depressão. E nos seus delírios de deprimida pensava que, se morresse, teria muitas flores em seu caixão, para compensar a rosa que não tivera em vida. E parava na frente das floriculturas, negando a beleza dos grandes arranjos, e gostando tão somente de uma rosa sem embalagem, ao natural, que entrevia num vasinho, ao lado de sua cama. De repente, mais barata do que uma lavadora nova ou um carro melhor, a rosa tornou-se cara, o grande sonho de consumo de Dilma. Mas ela não ousava pronunciar isso a ninguém; guardou consigo sua decepção e sua dor.

Alisson vivia segurando seu dinheiro, dizendo que precisavam economizar. Além disso, tinha a faculdade das filhas. Nunca mais foram sequer ao cinema ou a uma sorveteria. O tempo de Alisson passava na tevê, e ele não parecia notar que nas novelas a que assistia havia um drama bem menor do que o que se passava em sua casa. Dilma ia deitar-se cedo, como para fugir ao próprio casamento.

Um dia, Dilma voltava do trabalho, a pé, cheirando a remédios, vestida de branco com o uniforme da farmácia e sentindo-se especialmente mal. Não sabia o que fazer, se falava com Alisson, se já lhe pedia o divórcio. Esta última hipótese lhe parecia a mais difícil, pois teria que morar sozinha e jamais morara sozinha em sua vida. Talvez um abismo se lhe abrisse sob os pés se continuasse a pensar naquilo, de forma a que se concretizasse.

Vinha Dilma cheia de angústia numa tarde quente - era horário de verão. Quando estava próxima de sua casa, um barulho alto começou a incomodá-la, mas logo sorriu, ao ver que vinha um helicóptero - ela adorava apreciar helicópteros. E o helicóptero parecia rodear a sua própria casa. "Que besteira", pensou, enquanto abria o portão, sempre elevando os olhos para a máquina.

De repente, uma chuva de pétalas de rosas brancas caiu sobre ela, e Dilma não acreditou. Ficou em pé, esperando, e a chuva continuava, e espoucavam fogos. Ela pensou o que seria aquilo, até que o esparramar de pétalas cessou.

Então, entrou em casa e surpreendeu-se. Alisson estava de terno e gravata no meio da sala, que estava toda ornada em gigantes buquês de rosas e tinha bexigas coloridas no chão. Alisson estendeu-lhe a mão esquerda, e com a direita, deu-lhe uma única rosa vermelha, sem embrulho, tendo antes beijado a flor.

"Meu amor, você é tudo para mim", disse o marido. "Queria comemorar com você o dia em que consegui, com meu esforço, fazer uma grande surpresa para você. Vamos sair para jantar?", perguntou.

De repente, Dilma ficou com vergonha de estar vestindo aquele uniforme e, como se Alisson lhe adivinhasse, levou-a ao quarto, onde mais outra infinidade de rosas havia e, sobre a cama, um vestido vermelho muito fino repousava. Tomou-lhe da mão a rosa solitária e pousou-a num vaso adequadamente colocado no criado-mudo do lado em que Dilma dormia.

"Tome um banho, querida, e vamos sair!", convidava Alisson. No banheiro da suíte, mais rosas, além de grandes velas olentes que compunham uma meia-luz convidativa ao relaxamento.

No jantar, Alisson contou como teve a idéia de fazer aquela surpresa havia três anos e, desde então, guardou todo o dinheiro que podia, que era pouco, para fazer aquela mega-surpresa para Dilma, que ouvia tudo ruborizada e com uma pontinha de culpa. Por fim, depois de muito tempo calada, disse:

"Querido, sabe aquelas pétalas que cairam do helicóptero, e todas as rosas da sala, do quarto e do banheiro, e todas as velas, e o vestido, e o incenso com que você perfumou a casa?"

"Sim, querida".

"De tudo aquilo, o que eu mais queria era ver o que vi: sua mão me oferecendo uma única rosa". E beijaram-se, iniciando um novo namoro.