CAROLINA
Sophia Lange
 
 

Abriu os olhos. Espreguiçou e puxou com os dedos do pé a cortina para ver lá fora. Céu nublado, chuva... Saco!, pensou. Levantou da cama como uma gata, com movimentos leves, graciosos e olhou no espelho. Quase trinta!

Mas e dai? Era hoje. Hoje ela ia sair daquele marasmo sexual. Nem lembrava há quanto tempo não ia para a cama com alguém. Mentira, o Jorge, amigo gay, dormia sempre na casa dela. E sempre dormiam juntos, porque como boas amigas, gostavam de ficar conversando e rindo até a claridade avisar que a brincadeira acabra e que era hora de lembrar que se é adulto. Carolina só fazia samba... Porque samba e amor a noite inteira, estava difícil. Ainda assim, sentia muito sono de manhã. Mas fora o Jorge, que não é propriamente dormir com alguém, ninguém!

Carolina não transava por falta de quem quisesse. Carolina não transava há meses, porque ficou cansada de ir para a cama com um carinhas vazios, que não vão dar carinho. Carolina virou uma sentimentalóide que queria amor. Amor até as entranhas.

Carolina queria ir para a cama com um cara que a abraçasse, beijasse que enroscasse os pés nos seus... Fizesse cafuné. E não sumisse de manhã... Ou que ela não quisesse fazer sumir nas primeiras horas de sanidade pós-sexo-louco. Que trouxesse uma caneca de café para ela na cama, que trouxesse o café na caneca certa, que soubessem que ela toma café com adoçante e quantas gotas são necessárias para fazer sua manhã feliz.

Mas aí, tem esse cara, né. Que ela sempre foi a fim. Um babaca de marca maior... Não daqueles que todo mundo sabe ser, menos ela. Simplesmente um babaca, como tantos desses babacas comuns por aí.

E daí que o babaca, desculpe, o cara... Finalmente resolveu marcar uma saída com ela.

Carolina queria sexo. Mas Carolina queria também amor... Essa coisa tão banal, tão feia da gente sentir. Qualquer dia você vai estar andando por aí e espalhados pelos postes das cidades cartazes de "Procura-se"... Com fotos de pessoas enamoradas, apaixonadas, que amam. Amar hoje em dia é errado. Motivo de vergonha. Vexatório. Mas Carolina queria amor.

Sugeriu jantar na casa dela. Ela a comida (prato principal). E ele o vinho. Fechado. Às 20h? Ok.

Depilação; Carolina não cozinha. Menus. Entrega? Ah, não, mal passado não. Ao ponto. Não, nada para beber; unhas.
Com que roupa?
Não, esse não: oferecida demais.
Esse? Ai, não sei, acho que to meio velha pra essas investidas.
Pronto, esse.

Carolina passou o dia na expectativa... Estava apaixonada por alguma coisa que não existia: fato! Mas quem se importa? Que mal há em ter horas, momentos, dias mais felizes por uma ilusão trouxa de que se tem alguém especial?

19h30... Já estava tudo pronto. Mesa, Carolina, Carolina, mesa. Carolina espera. Verifica tudo de novo. Os detalhes da decoração... Se olha no espelho, escova os dentes de novo, passa um pouquinho mais de perfume. Acha que passou demais e corre pro banheiro para tirar com um pouco d'água. Ai, oito horas.

Mensagem de celular!

"Ocorreu um imprevisto. Não poderei ir. Depois nos falamos".

Assim mesmo, sem nem um beijo.