Tema 179 - QUATRO ESTAÇÕES
BIOGRAFIA
DE ESTAÇÃO EM ESTAÇÃO
Ana Stela

O trem deixa a estação, lentamente, ganhando força e velocidade à medida que avança pelos trilhos. Às margens da ferrovia, debruçando-se sobre cercas e muros caiados de branco, as primaveras tingem a paisagem, contrastando com o verde da vegetação caipira. Estamos no interior do país e a beleza é estonteante, ou talvez o ar, de tão puro, nos faça ter essa sensação de "ausência". A manhã agradável e bela convida ao cochilo diante da tela do mundo real, que se descortina aos nossos olhos.

As casas passam por nós, as fazendas surgem e também passam, as horas passam; a vigília cede lugar ao sono, embalado pelo barulho da máquina e pelo chacoalhar dos vagões, remetendo-nos ao colo materno da infância perdida.

Meio-dia. O apito estridente nos indica a hora de saltar para o almoço na próxima estação. Caras de sono, olhos inchados e incomodados pelo sol forte, quente, e pela poeira que paira e custa a pousar de volta no chão de terra. Àquela hora, o mormaço nos faz suar; nenhuma brisa movimenta o ar, nenhuma folha se agita nas árvores; o calor nos dá a impressão de que já é verão -mas ainda estamos em setembro!

Partimos novamente e agora vamos pela serra, subindo, subindo sempre. O vale fica para trás, enquanto o trem vai serpenteando pela montanha, contornando-a devagar, e com o cuidado que requer o transporte daquela preciosa carga de seres humanos acomodados em seu interior. De repente, uma chuvinha fina começa a cair, molha as vidraças e nos arrepia a pele. Lá fora, a natureza bebe e agradece a bênção da água generosa, sugando para o seio da terra aquele líquido precioso. Fazemos mais uma parada, descemos naquela estação, tiramos muitas fotos da paisagem, tomamos um lanche quente, para agüentar o restante do trajeto. A tarde chega ao fim, o calor também, mas a nossa viagem não. Muitos passageiros procuram tirar da bagagem um agasalho qualquer para se aquecer naquele friozinho típico das tardes do outono que a convenção humana já decretou fora de temporada.

A noite nos alcança exatamente quando alcançamos o topo da montanha. Está escuro, faz frio além do previsto, e nem todas as janelas fechadas ajudam a amenizar a sensação térmica de inverno precoce. Todos se encolhem, se aninham nas poltronas, uns nos outros. Mas não era isso que todos buscavam: curtir o frio da serra? Última parada, última estação. Sorrisos se abrem, chegamos ao nosso destino.

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