Tema 192 - MEU TESOURO!
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FOFOCA, FOFOCA...
Doca Ramos Mello

Esse negócio de falar que Onofrinho, meu neto, nunca prestou, é coisa dessa gentinha bocó de Perdões, aqui quase ninguém valoriza o talento local, o que mais se faz aqui é ficar louvando o povo de fora, mesmo que seja uma pessoa lesa... Veja que o novo prefeito até foi buscar na capital um tal escritor de livros para ser secretário da educação daqui e o homem está mais perdido que cego em tiroteio, não sabe onde fica uma única escola, já havendo quem diga que bebe muito mais pinga e pega putas rameiras que escreve histórias... Bom, mas eu digo de boca cheia que meu Onofrinho, desde pequeno, já tinha essa pinta de famoso que é hoje, juro! Isso também atrai rancor e inveja, sabe como é, daí a fofoca...

Depois que entrou para a política - não estou falando de ser candidato ou eleito, Onofrinho sempre preferiu ser assessor -, foi crescendo, crescendo, que só vendo de perto p'ra entender o sucesso dele. No final, acabou se tornando homem de confiança, braço direito e esquerdo de Vantuil, o ex-presidente da nossa Câmara, marido daquela messalina da Gecycleide (se ela pensa que alguém aqui não sabe das furunfadas dela com o gigolô do Rogê, então a loirice de farmácia lhe atacou os miolos, pois a gente sabe, sim, até dos detalhes sórdidos). É conversar com Gecy que ela conta as peripécias que meu Onofrinho enfrentou para ajudar o Van, quantas noites sem dormir, quantas pessoas a achacar, quantas mutretas teve de fazer para que o chefe ficasse numa boa. Só não deu conta de levar o homem a ser prefeito, como era desejo do próprio Van e da gente dele, porque o velhote Rodrigues teve o patrocínio de um milionário que quer anexar Perdões à fazenda dele, mas deixa p'ra lá...

Pois bem, a vida de meu Onofrinho é uma poesia de sucesso. Aqui mesmo em Perdões, quando uma pessoa queria uma coisa qualquer, no tempo do Van na presidência, falava direto com meu neto, ele até nomeava gente na Câmara. Sabe o Agaciel Maia? Onofrinho era tal e qual ele lá, com mais mansão porque ele tem é várias, é um montão, todas compradas com o esforço do trabalho e por isso mesmo o imposto de renda nem sabe. O leão quer botar a mão em tudo e Onofrinho não é besta, então eu tenho casa dele no meu nome e até uma amiga da bisavó dele pelo lado do pai tem mais umas quatro casas, castelos e mansões, tudo também no nome dela, mas ela própria mora num barraquinho perto de Vila do Ó, onde vive na pobreza mais pobre daqui, nem sonha com essas casas.

Infelizmente, porém, desde que Vantuil perdeu a eleição para prefeito, muita gente virou a cara para Onofrinho, agora tem gente de penca p'ra dizer que ele era um ladrão no meio de um bando de ladrões, só que, na época, não apareceu um fariseu com cara e coragem para lançar essas coisas na roda, aqui ninguém é louco, fora o interesse... Sim, porque Perdões é uma rotina indecente, se divide em quem está mamando no poder e quem quer arrumar um jeito de mamar no poder, aqui ninguém vale uma cuia de água suja, Jadilúcia mesmo, a jornalista irmã de Gecycleide e cunhada do homem, pois Jadi conta no jornal as putarias de todo mundo, qual é a novidade? E jogou umas merdas do cunhado no ventilador, deu problema sério. Tem quem diga que aquele dente quebrado que Jadi andou exibindo na cidade foi coisa de Gecy, que enfiou o braço nela... Ficaram inimigas de infância.

A gente estava falando de Onofrinho...

Na assessoria de Vantuil, meu Onofrinho se destacou desde o momento em que largou tudo, inclusive a mulher, Mara Rúbia (trocada por Rosinete Peito de Pombo, assim que ele subiu na vida) e seus quatro filhos, mais o boteco onde vendia umas pingas vagabundas e coxinhas venenosas, para assessorar o chefe. Bom, assessorar, que a gente saiba, era uma coisa que ia desde puxar o saco do Van a mandar conversar com São Pedro ou o diabo quem se dispusesse a falar um A contra o marido de Gecy, ou a fazer qualquer coisa contra ele. Numa palavra, Onofrinho era um capanga. Prestigiado, temido, o homem do homem!

E não é por isso que me orgulho? Então! Meu Onofrinho, autoridade de mando, tesouro aqui da vovó!

Mas, meu neto gostava de se engalanar demais, parecia um pavão no meio das autoridades, isso sempre atraiu a inveja de gente que nunca passou de um bosta qualquer. Os políticos têm uma especial queda para se deixar cercar da mais grosseira ralé, puxa-sacos, pulhas, cafajestes, aduladores, salteadores, biltres, putas, canalhas, meliantes, sórdidos, ordinários, sacanas, alcoviteiros, mequetrefes, boquirrotos, plebe, gentalha, desordeiros, infames, canalhas, tratantes, matadores, gigolôs, rufiões, bandidos, estelionatários, proxenetas, velhacos, corruptos, patifes, infames, ladrões, criminosos... Porém, Onofrinho era muito mais, e a inveja desses pés de chinelo sempre correu solta em cima dele...

Com a derrota do Van, meu Onofrinho perdeu a vaga de assessor e muitos acreditaram que ele acabaria na miséria, houve até quem apostasse na debandada de Rosinete Peito de Pombo, que aquela lá, justiça seja feita, gosta mesmo é de balançar na rede, mas meu neto não ficou roendo as unhas, tratou logo de diversificar as atividades. E sumiu de Perdões. Como sempre, os invejosos inventaram cada barbaridade sobre ele que só vendo! Nada pegou. Até que esta semana, para calar a boca dessa gentinha, Onofrinho apareceu na tela da tv, em rede nacional, naquele jornal de marido e mulher, todo pimpão, a jaqueta de marca jogada nas costas, o cabelo melecado de gel, de pulseirinha que junta os dois braços assim na frente do corpo, cercado de seguranças e policiais. Parece que tem negócio grosso com políticos de Brasília, alguma coisa com um senador desses graúdos. Nossa, que sucesso! Acho que, agora, meu neto enricou de vez.

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