Tema 019 - FAZ DE CONTA
BIOGRAFIA
DOBRANDO A ESQUINA
May Parreira e Ferreira

Você já reparou como a vida de novela é boa? Boa não só no sentido de linda e fácil, mas também na forma como as coisas se resolvem. Como eu gostaria que a minha vida fosse um folhetim do Mário Prata.

Imagine poder acordar todo dia bem vestida e penteada, ter uma (ou mais) ajudante solícita a lhe providenciar desde um copo de suco de cupuaçu gelado até o desjejum completo numa mesa posta impecavelmente. Isto sem falar que o táxi está sempre `a sua espera e você, como não poderia ser diferente, tem o dinheiro trocado exato no momento que desce correndo. Se bem que normalmente você poderá ter um motorista e/ou um carrão de fazer jogador de futebol ficar verde de inveja.

No escritório onde o chefe é você, as pessoas são bonitas e em geral muito eficientes. Você vai digitar sem erros um computador de última geração, ou fazer decolar uma aeronave com a mesma presteza com que estaciona sua Ferrari na porta do melhor restaurante onde o proprietário, aliás amigo querido, vem atendê-lo pessoalmente.

Chegar em casa, ainda mais se o autor é seu conhecido, pode ser o mesmo que chegar aos céus. O wisky é doze anos e pode ser bebido durante vários capítulos sem que você se embebede (salvo algum pedido extra de roteiro). Ir dormir é uma delícia. A cama já está arrumada (não falei que a ajudante é o máximo? Se você for homem ela pode até ajudá-lo a dormir), o quarto aquecido, a roupa de dormir etiqueta La Perla. Afinal, na sua novela a protagonista é você.

E o tempo então? Um ano passa em dois minutos. Você não sofre em gravidez, parto ou puerpério. O bebê já nasce crescido e maravilhoso. De um dia para o outro, são gerações que se sucedem. Quem morre, dependendo do Ibop pode ressuscitar no último capítulo, e quem não dá conta do recado, é sumariamente desaparecido.

Ninguém, mas ninguém mesmo, sofre de problemas intestinais em novelas, os banheiros têm piscinas aquecidas com hidro-massagem e é só. A não ser em algumas cenas do Almodóvar, artistas só lavam as mãos e escovam os dentes.

É claro que os feios, sujos e malvados, eu deixo para os outros núcleos, até porque só em ficção isto é possível.

Mas o melhor de tudo mesmo é que se a vida fosse essa novela, eu linda num vestido esvoaçante e chapéu de palha na cabeça, poderia, ao dobrar a esquina, cair nos braços e na vida do Luciano Szafir.

Protegido de acordo com a Lei dos Direitos Autorais - Não reproduza o texto acima sem a expressa autorização do autor