Tema 032 - NA CONTRAMÃO
BIOGRAFIA
CORRENTEZA ACIMA
May Parreira e Ferreira
Falar que alguém vai na contramão sugere no mínimo um acidente, envolvendo incautos terceiros desavisados. Quando eu era adolescente, alguns dos playboys, que subiam a Rua Augusta, faziam roleta-paulista com os carros envenenados na contramão do Túnel da Nove de Julho. Perdi um amigo no banco do passageiro dessa prova de iniciação à cretinice. Alguns hoje senhores responsáveis pais de família se arrependem e aconselham seus filhos, outros cresceram, não sofreram nem aprenderam com a experiência, continuam crianças mimadas querendo que o mundo se desvie deles. São adultos que mais fazem sofrer aos outros. Pessoas que muitas vezes nos desviam de nossa meta por sua estagnação biológica, intransigência e autoritarismo.

Há bem pouco tempo, participei de uma maratona aquática em Ilha Comprida, litoral sul de São Paulo. A largada da prova foi dada no pier da balsa, lado oposto a Iguape, a favor da correnteza do Mar Pequeno. Os nadadores tinham que contornar uma ilhota a dois mil metros, e voltar agora mar contra para a praia do Iate Clube local. Como diz o ditado, fogo acima e água abaixo ninguém segura. Chegar até a ilhota foi muito fácil. Ao contorná-la, o caldo começou a engrossar. Nós, e existiam muitos como eu, por sermos mais lentos ou menos preparados, pegamos a vazante do rio, e uma força de água que eu nunca imaginara até então. Quando percebi que nadando com muita força, não conseguia ultrapassar uma moita de bambu por detrás da minha braçada direita, entrei com esforço no mangue e comecei a andar, pés atolados na lama, me agarrando nos galhos baixos das árvores. Ao pensar em cobras e caranguejos, minhas pernas subiram imediatamente e a força da correnteza as colocava na linha d'água, sem qualquer comando. Os barqueiros vieram nos resgatar transcorridas mais de duas horas da largada. Por pouco e eu teria sido salva, ou não, pela balsa de Cananéia.

Aprendi na carne congelada, e no espírito abalado, o que é nadar contra a correnteza. E há quem ache isso, forma de rebeldia, de protesto, jeito de enfrentar o estabelecido socialmente. Eu acho loucura.

Em Ilha Comprida aqueles que souberam sair do fluxo da água no meio do canal, se safaram pelas margens e completaram a maratona, não sem sofrimento, mas sem desgaste excessivo e sem medo. Saber contornar as dificuldades e escolher o caminho adequado foram os fatores decisivos para os nadadores completarem o percurso.

Há-de ser assim.

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