O OUTRO LADO
Viviane Alberto
 
 
Não vale a pena esconder...

Acredito que a gente seja mesmo como a Lua. Um lado muito denso, escuro. E a outra face redonda, linda, iluminada.

Têm coisas que a gente chega e mostra logo de cara. O bom, o melhor. Já outras a gente joga pro lado escuro, desejando que fique lá pra sempre. Quem sabe murche e morra com a falta de luz. Mas enterrar, não enterra. Pelo menos não definitivamente.

Medo, segredo, defeito todo mundo tem. E não é gostoso, não é bonito de se ver. Eu conheço bem minha face mais bruxuleante e confesso que não seria adequada pra colocar neném pra nanar.

Mas também não consigo desprezá-la por completo e, menos ainda, matá-la. Afinal, bonita ou feia, faz parte de mim. Mas eu conheço essa danada muito bem. Eu percebo cada contorno, cada nuance que esse meu monstro particular adquire. É como uma sombra que você vê sempre no porão. Vai passando o tempo até que um dia ela já não te assusta tanto. Talvez, você imagina, seja apenas o contorno de um móvel velho, largado lá. Mas, pra garantir, você não desce muito ao porão...

É um tanto assustador quando a gente toma consciência de que não tem controle nenhum sobre essa porção negra do nosso coração. Ela costuma aparecer naqueles recantos silenciosos da nossa mente. Palpitando, julgando o que não é de sua conta. Nem de ninguém.

E muitas vezes, você chega a encontrar ainda uma terceira face. Uma parte que você até ama, mas não sabe se o mundo poderia amar. É o seu pedaço pecado em estado bruto. Quase uma jóia. Aquele que sabe tudo de você. O que faz tudo que você, em sua versão gente fina, boa praça, pessoa iluminada, não faria.

Uma face que omite, mente um pouquinho. Abusa um pouquinho da sorte. Ousa. Odeia. Planeja vinganças. Chora como condenada. Sempre encontra forças pra ressurgir das cinzas. Ama, ama, ama. É capaz de matar. Ou se matar. Mas faz tudo isso escondido, porque quem sabe o que os vizinhos poderiam dizer?

Tudo porque não importa quantas árvores você plantou, quantas crianças você já ajudou ou quantos livros você já leu. Nem mesmo importa que você já tenha escrito um. Não faz diferença se você não come carne vermelha e só usa couro falso. E não tente argumentar quanto ao número de velhinhas que você já ajudou no sinal.

Quando descobrem teu delito, ainda que íntimo e inofensivo pra humanidade - mas não pra moral - acaba o mundo, rasga o véu. Princesas viram prostitutas num simples levantar de saias e príncipes acabam indo lamber sabão. Pior pro mundo, pros outros. No fim de tudo, o que eles querem conhecer é só uma parte muito pequena daquilo que seria o todo. Um marionete, um sósia, programado pra sorrir e dizer obrigado.

Quem quiser conhecer a verdade não pode ter medo do escuro e tatear também do lado negro, que nada mais é do que a fusão de todas as outras cores. Não tem perigo. Perigosa é a hipocrisia.

 
 
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