SE EU FOSSE UMA MULHER ALTA
Viviane Alberto
 
 
Eu achei um acinte, fiquei ofendidíssima. Nada de novo, já que me sinto ofendidíssima por qualquer coisa ultimamente, tempos loucos. Mas foi demais aquilo, foram trinta centímetros!

Eu explico. Fui comprar um jeans. Nada de novo até aí, certo? É, só que eu precisei cortar trinta centímetros da calça pra fazer a barra. Tem cabimento? Tem, já que era aquele número que me cabia, mas eu me senti uma coisinha mínima, uma mesinha de canto, um abajur.

A vendedora da loja ainda teve a pachorra de sugerir (com um sorrisinho nos lábios, parecia ter mais de um e setenta) que eu levasse uma sainha. Sabe como é, “por causa do calor...”, engraçadinha.

Fazer o que, parece um fenômeno recente. As mulheres no Brasil resolveram crescer agora. Basta um olhar mais atento nas ruas pra perceber, todas aquelas meninas e suas pernas intermináveis. Um porte diferente, sabe. Altivas.

E isso de postura conta muito na aparência de uma pessoa. Me diga, como é que vou ser altiva, do alto desses um e sessenta tão esticadinhos? Sem chance, melhor me conformar com outros atrativos. Procura-los, estejam onde estiverem. Conquista-los à unha!

Acho que a palavra é mesmo conformar, porque não dá pra siliconar. Também não cabe aí uma lipo. Posso, como se diz, dar uma mexidinha no nariz, mas na altura não tem jeito.

Antes era mais fácil. Mulheres altas estavam apenas nas revistas. Com isso dava pra lidar, porque, em caso de reclamação a gente disparava: vai atrás dela, ué! Lógico, sabíamos que elas só estariam em Nova York ou na Dinamarca. Agora não. O pecado longilíneo mora ao lado, não dá pra bobear. Se você mandar, o príncipe vai mesmo atrás da cinderela sem saltinho.

Alcançar os livros nas prateleiras mais altas seria bem interessante, mas fora isso, será que faz tanta diferença assim? Sei, esse texto é a prova cabal de que sou uma baixinha despeitada, eu assumo. Mas aqueles trinta centímetros me tiraram do sério. E sempre tem aqueles que tentam consolar: imagina, você é tão simpática/legal/bonitinha! Aliás, bonitinha é outro adjetivo fatal, pelo menos pra mim. Bonitinha é feinha enfeitada. E não tem coisa pior do que lamentação de feia, como bem disse o Veríssimo.

A coisa mais chata em ser baixinha não é uma coisa, é um conjunto de coisas. Primeiro, acham que, por ter a altura de uma quase criança, você ainda é uma criança. E eu não digo isso por causa dos diminutivos (amorzinho, mocinha, sapatinho) porque isso eu também gosto de usar. É uma coisa mais dissimulada, como aquelas almofadas ridículas que davam pra gente colocar nos carros antes de alguém, um anjo baixinho (aposto!), inventar os bancos com regulagem de altura.

Outra coisa são os espelhos em banheiros públicos. Parece que foram colocados pros ucranianos escovarem os dentes, não nós. A gente se vê do nariz pra cima, enquanto as tops verificam se o cinto está no lugar.

E tem toda uma série de conselhos fashion patéticos. A altura das saias não pode ultrapassar os joelhos. Não usar listras horizontais. As botas não podem ter o cano muito alto. Aliás, nem chinelos a gente pode usar em paz, porque até as havaianas velhas de guerra hoje vêm com plataforma. Acho que é pra gente ir pra praia com a cabeça erguida.

Esqueçam, loiras, o mundo agora prefere as altas. A mim, resta ficar aqui, ressentida, com os pedaços da calça jeans na mão. Já que não dá pra crescer de um modo encantado, como se fosse um pé de feijão, o jeito é olhar a coisa por um ângulo mais atraente. Pensando bem, esses retalhos poderiam virar uma blusinha. E então eu não teria apenas uma calça nova, mas um conjunto!

Ta certa aquela personagem da tv, não basta um corpinho bonito (e comprido!), tem que ter muita cuca no lance... Falei?!

 
 
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