SE LULA FOR ELEITO
Alberto Carmo
 
 
Caro Lula, não me leve a mal, não é nada pessoal, até torço para que você arrume uma aposentadoria decente aí no seu sindicato, e passe uma velhice saudável ao lado dos seus camaradas e companheiros.

Mas, falando sério, eu queria fazer um acordo tácito com você. Antes que eu me esqueça, o vocábulo "tácito" está descrito na página 1640 do Aurélio, segunda edição, revisada e ampliada. Deve haver um exemplar lá no barzinho do sindicato, provavelmente embaixo da TV. Qualquer aflição, não hesite, dê uma folheada básica no catatau.

Onde estávamos mesmo? Ah, no sindicato. Quer dizer, você estava, eu jamais entrei num sindicato. A ver vagabundos, prefiro os da Praça da Sé.

Voltemos ao nosso acordo. Veja se você concorda. Em caso positivo, aponha o polegar, devidamente engraxado, no quadradinho à esquerda do nosso tácito contrato.

Vou tentar ser mais claro. Caso você vá lá para o planalto da rapina, topa fazer um esquema comigo? Pode confiar, não vai precisar pagar nada. Esquema você sabe o que é, imagino.

Então, o negócio é o seguinte: Assim que você, caso o destino nos pregue essa peça de mau gosto, assumir, eu fiz aqui uma listinha de algumas coisas que eu queria. É pouca coisa, você faz num piscar de olhos.

Primeiro, cancele meu R.G., pois eu não faço parte do país a que você pertence, meu país é outro. Eu gostaria, assim como o fazem os namorados vez por outra, de dar um tempo no meu relacionamento com o Brasil. Assim sendo, enquanto você estiver por lá, risque-me do seu caderno - como diria Jamelão. Eu não vou fazer falta, ninguém vai perceber. Combinados? A validade do meu R.G. expira no dia da posse? Perfeito, devo essa a você.

Claro, o meu CPF também dança na brincadeira. Eu, como você, de bobo não tenho nada, e meus filhos se acostumaram a associar sua digníssima figura à do bicho-papão. Sabe, aquelas coisas que a gente diz aos filhos, quando querem cabular a aula, algo como "se você não for à escola vai ficar como ele quando crescer". Portanto, deixe meu rico dinheirinho ser aplicado no estudo das crianças, assim evitamos que, no futuro, algum outro idiot... er... cidadão despreparado, queira pôr a carroça na frente dos bois.

Eu sei, eu sei, há séculos que a rapinagem domina o poder. A gente já se acostumou, prezado metalúrgico. Não somos ingênuos a ponto de querer a continuidade, mas também não somos estúpidos para dar um tiro nos pés. Nós, aqui, se refere a brasileiros de verdade, que amam o país, que trabalham no anonimato a vida inteira, sustentam a trupe planaltina, e não têm tempo a perder em greves, passeatas. Há uma família a sustentar, filhos a educar. Imagine se um trabalhador verdadeiro tem lá tempo para perder na leitura de socialistas e outros "istas" e "ismos". Essa turma que fala muito, pouco faz, ou produz.

Okay, okay, (não confunda com o OK que veio no pára-brisa do seu automóvel) você diz que optou pelos pobres. Perdoe-me, caro torneiro, mas os seus pobres são diferentes dos meus pobres. Os seus gostam de roubar, ganhar coisas de graça, apitar nas ruas, invadir o que é dos outros. Aliás, vocês gostam mesmo de um bom churrasco, pois não? É só ter alguma vaquinha nalgum pasto que vocês logo matam a bichinha e se fartam. Trabalhar mesmo só no papel, né?

Os meus pobres mal têm tempo para ver TV. Ler jornais então, nem pensar. Manter a despensa com alguma coisa custa um bocado de suor, e é tarefa de tempo integral. Há que se ter jogo de cintura para arrumar uns bicos. Mas os meus pobres não ensinam os filhos a invejar o que é dos outros, nem a querer coisas na vida "de grátis". Eles são educados para conquistar, a duras penas, seu espaço, seu ganha-pão. É assim que eles progridem, trabalhando durante o dia, e estudando até dormirem nas carteiras. Se eu visse meu filho apitando na porta de algum banco, ou tomando pinga na sala de recreação de algum sindicato, dava-lhe uns bons puxões de orelha. Aqui, no mundo dos meus pobres, educa-se os filhos desde que são "de menor", até que saiam a buscar na vida seus ideais, com seu próprio trabalho.

A mudança do país não se desenrola entre seus comparsas, mas já anda adiantada entre o povo (o meu povo, não o seu, bem entendido!), criando uma geração que tem sangue bom, que não tem medo do trabalho, e entende que a violência, a ignorância, a usura, são apenas a merda que uma geração de desmiolados joga no ventilador, enquanto vão sendo expulsos do planeta.

Outrossim (corre lá no pai dos burros!), e tenho certeza que até você vai entender, a ter suas barbas de molho na sopa do planalto, eu prefiro os olhos verdes da Roseana. O que faz o teatro é a platéia, não os fantoches no palco.

 
 
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