VERDEJANDO
May Parreira e Ferreira
 
 
Temos uma rotineira vida de olhar para onde andamos, ninguém quer pisar em falso, e com isso perdemos coisas que acontecem lá em cima, entre o céu e a terra. Perdemos de conhecer pintassilgos, gaturamos, tangarás, as andorinhas em revoada que anunciam chuva próxima. Isto sem contar a numerosa quantidade de árvores de copas coloridas, ipês brancos, roxos e amarelos, suinãs encarnados também chamados sapatinho-de-judeu, jacarandás e seus cachos lilases. Poucos são os que conhecem as rosas, a rosa do Pequeno Príncipe que tem a convicção de ser única em todo universo. Bem verdade, cada rosa é uma rosa, e como é freqüente nos distrairmos delas, e não com elas. É preciso estar atento às rosas, atenção especial às vermelhas. A perfeição da rosa nos faz pensar que a vida é outra coisa diferente nas estrelas. É preciso estar atento para ouvir o coração das plantas. E dos bichos. E dos homens. Quando estamos curiosos e serenos as coisas que nos acontecem ganham nuanças, partes falam pelo todo. Esta é uma pequena história colorida que poderia ser a sua, ou quem sabe até a minha.

Eram dois pares de olhos, os dela de um castanho muito claro, os dele de um azul celeste, azul do paisagismo inglês. Os olhos castanhos nasceram verdes, lindos olhos verdes, curiosos, mas incautos. E sofreram, amaram, choraram e se tornaram castanhos, medrosos e des-animados. Os azuis já nasceram azuis, mas se tornaram mais azuis porque eram curiosos, apaixonados e nunca deixaram de procurar o outro lado das montanhas. E andaram, sofreram, amaram e ainda sorriem instigantes. Numa tarde comum, numa praça comum, esses pares de olhos se encontraram e trocaram entre si informações sobre suas semelhanças e diferenças. E como já sabiam que a melhor ilusão é aquela que nunca morre, fizeram um pacto de olhar, iriam estar sempre juntos se vendo sempre mais, e procurando um ponto comum no horizonte. São felizes desde então, ele vivendo de vê-la azul e ela vivendo do azul dele, com olhos que voltaram a verdejar.

 
 
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