BEIJO ROSA
Rosi Luna
 
 
Vou contar sobre um encontro que saiu do virtual para o real. Precisamente um primeiro encontro e por isso teria que ser planejado com todo carinho, nos mínimos detalhes e nada melhor do que consultar o seu par. Ele achou aquilo tão inusitado, mas resolveu colaborar com as respostas e falou com toda sinceridade possível, está tudo aqui.

Eles pensavam muito na palavra beijo e como aquilo realmente aconteceria. E como seria materializar o ato do beijo. Ela pensava assim, um beijo é uma estrada, uma trilha de línguas. Talvez, um beijo e uma rosa.

- Que lugar quer marcar o encontro?

- Paris e quero que seja em algum lugar no bairro dos artistas.

- Que tal esse hotel?

- "Le Bouquet de Montmartre" - 1 Rue Durantin, fica no 18 Arrondissement - Montmartre.

- Já esteve nele ou só escolheu pelo nome?

- Nunca estive nesse hotel, vou estar lá com você.

- E como vai estar vestido?

- Com um casaco de couro marrom e calça de homem, talvez leve uma camisa no cabide.

- E como devo estar vestida?

- Se for à noite, um vestido preto com decote e se for de dia, um jeans, camiseta e sem maquiagem. Não gosto de base ou pó translúcido, aquilo gruda no rosto, não consigo sentir sua pele. Gosto de cara lavada, só um batom cor da boca.

- Usa esses perfumes fortes de homem? Não gosto de perfume, só cheiro de sabonete.

- E você?

- Vou escolher um suave, para que você consiga sentir o perfume natural da minha pele, gosto de cheiros de pessoas também.

- Qual é o museu que você mais gosta?

- Musée d'Orsay, meu preferido em Paris.

- Quer saber o meu? Gosto de um museu localizado num antigo hotel onde Rodin morou por um tempo. Tem um jardim lindo, bem ao estilo francês. É um museu de vanguarda que fica na Rive Gauche, tem muitas esculturas e algumas obras de Camille Claudel. Não consigo lembrar o nome dele agora, mas estou certa que fica no Jardim de Tuilleries.

- Me diga um objeto de desejo que gostaria de ganhar?

- Um charuto, mas é muito caro, não vai cometer esse despautério. E me fez lembrar até a origem dessa palavra "Despautère f. afrancesada do sobrenome de Jean van Pauteren", isso é um grande disparate.

- Me diga: como peço um charuto numa loja?

- Peça um Corona Especial e Siglo III são os tipos que já indicam a espessura e o comprimento, esses são charutos que nunca fumei. Objetos de desejo mesmo, raridades. Já fumei vários Cohibas, e normalmente um Corona comum. Esses dois que indiquei são raríssimos, custariam por volta de US$ 200 cada. Um bom charuto cubano custa na França uns US$ 25.

- Tenho um objeto de desejo também e nem é tão caro, pode me dar um? Quero um buquê de rosas vermelhas, quero que me faça uma surpresa. Nunca ganhei um, apesar de escolher todas as flores dos eventos que trabalho.

- O que gosta mais: café ou cappucino?

- Café e vou sugerir Cyber Cafe Village Montmartre fica no numero 6 rue Ravignan - Abbesses.

- É impressão minha ou tem um roteiro pronto para o nosso encontro?

- Acabo de imaginar tudo na minha cabeça. Você não queria um lugar romântico? Não sei de lugar melhor.

- Que casaco acha que devo levar?

- Eu te daria um de pele.

- Não sabe que sou contra a morte de chinchilas? Eu as vi num criadouro e elas eram climatizadas. Fiquei triste só de imaginar que logo elas iriam virar casaco de pele, sou muito ecológica pra usar.

- Sou a favor da criação comercial desses pequenos animais e te dou um casaco e falo que é de pele artificial, vai usar e ficar linda.

- Não conte com isso, sou "expert" em descobrir tudo, mesmo sabendo que tinha a melhor das intenções.

- Então vou escrever a cena do encontro, me fala se você está de acordo?

"Ela chega no local combinado em frente ao Cyber Café, ela não o vê. Ele está do outro lado da rua e fica observando como ela pode ser tão dispersa. Ele acha lindo esse jeito dela ser, digamos meio fora de órbita. Eles tomam café, conversam, brincam na internet e depois vão para o hotel. Eles se conhecem, mas ainda não teve nenhum envolvimento, não trocaram carícias. Por enquanto tudo é desejo e descoberta.

No hotel ele pede um champanhe, fazem um brinde, ela está muito tensa. Ele sorri e fala: tenha calma, vamos namorar um pouquinho. Eles ficam juntos e vestidos, ele não tem pressa de tirar a roupa dela. Ela vai se soltando, vai lembrando que é primavera em Paris e que está vivendo um momento romântico. E pronto! Ele vem bem devagar e acontece - o beijo. Eles vão se encaixando como uma caixa dentro da outra, vão fazendo laços, vão abrindo espaços.

A noite tem uma lua branca e um homem que encanta. E tem a musicalidade que provoca uma dança de corpos em movimentos contínuos. E o amor jorra como uma fonte de uma praça. E Paris tem perfume e paixão.

Na manhã seguinte, entre pães, queijos e marrons-glacês, ele encomenda a surpresa, sem que ela perceba. Ela faz a toalete matinal e quando vê está ali - um buquê de rosas vermelhas. O mais lindo que ela já viu e o único que recebeu. Ele faz rodinhas de fumaça com o charuto que foi presente dela. Ela sabe como ninguém, tudo, sobre despautérios. E o ar fica leve e doce."

E você sabe como é um beijo rosa? É um misto de batom rosa e flor natural. Tem cor, sabor e calor também. E respondendo a pergunta, acho que ele está de acordo com tudo sobre o nosso encontro. A gente não pára mais de beijar.

 
 
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