ESPELHO
Krika

- Você já tirou as suas sobrancelhas?

- Hã? Respondeu Catarina ao olhar para sua amiga pelo espelho.

- É, limpar as sobrancelhas, assim com a pinça, falou novamente Carol para a amiga pelo espelho também.

Carol e Cathy são amigas há muito tempo, mais de 20 anos. Conheceram-se na pré-escola e até hoje são amigas.

Sempre conversaram muito, mas os papos mais sérios eram tidos na frente do espelho. Ficavam ambas de frente para o espelho e engatavam vários papos. Normalmente no quarto ou no banheiro da casa de uma delas.

Foi pelo espelho que confidenciaram o primeiro beijo, a primeira transa, o medo da gravidez precoce, as descobertas da adolescência e a perda de pessoas amadas. Até quando Cathy foi pedida em casamento e convidou Carol para ser a madrinha, foi de frente para o espelho. No casamento da Carol, de repente estavam lá as duas de frente para o espelho.

O mais engraçado foi que só se deram conta do que acontecia com elas no dia que a Carol perguntou a Cathy se ela limpava as sobrancelhas, na frente do espelho. As duas pararam, olharam uma para a outra e caíram na gargalhada. Começaram a lembrar há quanto tempo faziam isso, e quanto tempo perderam ou ganharam na vida, ainda não sabiam, conversando daquela forma.

O tempo passou, são avós e a Carol já é bisavó. Recentemente fundaram uma república de viúvas no interior do Estado e continuam firmes nos papos de espelho. Chegaram à conclusão que aquela atitude de falarem uma com a outra através do espelho transmitia transparência nos sentimentos e nas palavras, desta forma, elas conseguiam superar as pedras que a vida lhes colocou no caminho. O espelho passou a ser para elas um confidente, um amigo inseparável e até um psicólogo.

No espelho, transparecem as marcas do tempo, as rugas da face e as doenças da alma, mas nunca deixou de ser o porto seguro para Carolina e Catarina, que por sinal passou a vida sem nunca ter limpado as sobrancelhas.

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