CONSIDERAÇÕES DE MEIO DE SEMANA
Helô Barros

Sei..., quarta é meio. Se quarta-feira fosse uma maçã, o dia seria a semente ou o cabo. Quarta é a faca e a suculência, dia de esquina, de Adriana, de buscar as roupas na tinturaria, de sentar com o Sebas e escová-lo até sair o último pêlo solto do lombo, de fazer ginástica, de não tomar cerveja, de ouvir Beatles. Venha buscar esta coisa que sobe agora no meu espírito, esta tristeza por não aceitar a conveniência.

Quarta é doce, confraria. Antes disto o domingosegundaterça, depois, a quintasextasábado. Três pra lá, três pra cá, dança estranha de sentimento. As palavras engasgadas no meio de uma semana qualquer, uma quarta-feira no peito. Não quero ouvi-las ou lê-las. Faz um tempo que é assim.

A corrida tem me ajudado, me levado para o caminho da fonte, do cansaço. Sim é bom. Mas, e a produção, a porra da produção. Quero me retirar da angústia, fugir do que já passou. A vida inteira dedicada à cabeça, ao intelecto, aos livros, a ficar sentada, a dormir nas altas horas, a dobrar as esquinas a vinho, a atingir o clímax com um argumento, a derrubar o adversário com palavras. Será que é isso? Não tenho mais nada a dizer. Sou um buraco, um assunto sem explicação. Pra quê gastar tempo a entender razões? Vou assobiar uma canção sem tons, vou mudar regras, driblar a celeuma das tolas vozes nos meus ouvidos. Ouço e esperneio. Ahche! Vou ficar assim, agindo como bicho. Sou bicho. Ahche!!!! Vou ficar atrás do muro, da encosta de uma quarta-feira buscando uma experiência, um desempenho que não precise ser elaborado, um mato sem metragem, um sonho sem interpretação. Por que todas as coisas dizem a mesma coisa? Todas as quartas-feiras se enrolam, se repetem assim como o dormir e o acordar.

Da fome vem a urgência, o pontiagudo do grito, o satírico da vida, a turva onda que acolhe as madrugadas. Uma lembrança distante, tão distante que mal posso lembrá-la. Durmo e apareço entre tonéis de vinho, duas horas da manhã e eu exigindo todo o carinho do mundo entre as mãos. Eu soube naquela hora que estava sozinha. Eu e as minhas tolas conclusões.

Só quero o amor de volta. Venha, saiba que guardo a dor de não ser amada e não amei só pra variar o tema. Odiei pra não ser atingida e, a flecha me acertou o peito, em cheio. Peço que venha quando a noite for muito longa, quando a história for triste, quando o filme pregar medo. Volte sim, mas de uma outra maneira. Eu sou de outra maneira, mas continuo tendo fome de estruturas e amores intensos que normalmente são verdes e alaranjados. Ainda bem que ainda é quarta-feira.

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