A FRASE
Eraldo da Silva

Erra uma vez e tenta de novo, foi isto que fiz, se falhei novamente o jeito é admitir, se é que errei realmente, nas duas vezes o goleiro saiu fechando o ângulo, fiz o que tinha que fazer, coloquei no contra-pé dele, em ambas ela chocou-se com a trave, se não entrou, foi apenas um capricho dela, a bola.Se convertesse as chances teríamos virado o jogo. Ouvia os gritos do técnico:

´´-Por que não chuta de direita? ``

Realmente sou destro para escrever, mas jogando futsal sou ambidestro, para isto servem os treinamentos, depois chutei com o pé que estava mais à mão.

´´-Dá um bicudo!``

Não podia fazer o que me pedia, sempre a tratei com carinho e até chamava ela de você, como iria maltratá-la?

Colocava ela no peito, deixava deslizar em meu corpo e tocava com carinho, cometer um absurdo de violentar minha companheira justamente na hora do nosso prazer mais íntimo,o gol, de forma alguma.Talvez no lance que resultou o gol do adversário sim, se em vez do toque de classe tivesse dado um chutão com o bico do pé...E esta foi minha grande falha, jogar a bola nos pés do atacante deles. Perdemos o jogo.

O bom de jogar em time de empresa é a confraternização e o companheirismo dos colegas, o ruim são as gozações quando perdemos e cometemos falhas grandes, este era o meu caso naquele dia. Por sorte ainda teria o Domingo para pensar nas desculpas, afinal seria o alvo principal das cobranças e brincadeiras. Agüentar os comentários seria fácil, bastaria usar frases prontas que todo jogador usa, o pior mesmo seria estar estampado na caricatura semanal do Vágner, ele não perdia a oportunidade de usar seu talento em desenhar as situações engraçadas que aconteciam, nunca tinha sido vítima dele, já podia até ver-me no papel, os cabelos compridos, a boca grande e os dentões para fora, as pernas com certeza não seriam como as mulheres comentavam. Os desenhos que ele fazia, eram colocados no quadro de aviso perto do cafezinho. O jeito seria minimizar os efeitos. Decidi escrever uma frase e colocar no quadro de avisos, assim justificaria minhas falhas sem precisar ficar repetindo a mesma coisa a todos.

Cheguei cedo na Segunda-feira, fiz o que tinha de fazer e fiquei esperando. O primeiro a chegar foi o Zé Ribeiro, o mais gozador da turma, ele foi até o quadro e leu o papel que eu tinha colocado.Ficou rindo e fazendo sinal de negação, assim que uma turma chegou, foi logo chamando-os e mostrando o quadro.

-Leiam o que está escrito aqui! Mostrava com o dedo.

Errar é umano.

-Então Zé, errar é humano. Está certa a frase.

-Mas está escrito errado! Quem escreveu precisa voltar para a escola.

-Você não esta entendendo? Errar é humano! Respondiam todos.

Aquilo virou uma discussão sem fim, todos que chegavam concordavam com a frase, ele ficava louco por ninguém perceber a falha terrível, a ofensa à nossa língua portuguesa, um erro ortográfico imperdoável. Até o supervisor entrou na roda formada, inicialmente para tentar dispersar a bagunça, mas acabou se envolvendo no caso e também concordando com a frase.Foi um dia inteiro de longas conversas a respeito deste assunto, o Zé trazia funcionários de todos os setores para ver se alguém concordava com ele, a empresa toda leu o que estava escrito, ninguém discordou do texto.Ele passou o dia inteiro zangado, só foi sossegar no outro dia quando trouxe o dicionário e provou a todos que estava certo.

Adivinha quem foi o personagem da caricatura semanal?

Coitado do Zé, até hoje ele não entendeu que:

Erar é humano.

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