NAVIO FANTASMA
Sérgio Galli

Esperança vaga entrecortada entre entes que habitam as grandes cidades. Vagalhões de vaga-lumes vagueiam sem rumo, vôo cego pelas esquinas das grandes cidades. Na cidade fantasma, esqueletos esquecidos nos escaninhos esgarçam a esquálida realidade das grandes cidades. Cegos, os fantasmas vivos das grandes cidades, mal enxergam a si mesmo, quanto mais o outro. Vêem apenas o ouro do Reno, a cavalgada das Valquírias, o outro é invisível, não existe. E Siegfred? No anel dos Nibelungos, fantasmas, duendes, gnomos, bichos de sete cabeças, bichos da seda, saci-pererês, fadas, anões, vagamundos encontrarão a ópera dos três vinténs, a ópera do malandro, o banquete dos mendigos. No ensaio sobre a cegueira, cegueira branca de leite o tilintar surdo mudo do vil metal é o único valor presente na alma, na mente, no corpo dos fantasmas motorizados da cidade fantasma. O crepúsculo dos deuses é o réquiem para a civilização do eu, eu, eu, eu, eu, eu, ego, egóiga, ególatra, egoística, ergo, narcisista, gananciosa, ambiciosa, sem caráter, os fins justificam os meios, os meios justificam os meios. La nave vá. 

Embarco no navio fantasma de vaga esperança. A nau singra sangra pelo abismo profundo de um mar infindo. Mar de vagas estrelas. Quer ouvir o som do silêncio. O silêncio da sonata de Beethoven. Ouvir o murmúrio da minha angústia cavatina. Ouvir o ruído sinfônico de minh'alma atormentada. O quarteto das minhas cordas arteriais. A flauta vértebra da minha coluna em linha reta. Ouvir o lied dos meus demônios, meus fantasmas. Meu coração céptico, poético toca a valsa vienense.

"Esperança vaga. Alegria, alegria, era o que faltava em mim..." (Cartola).

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