FIDELIDADE ANGELICAL
Mairy Sarmanho

Quisera sempre ser fiel a mim mesma, dessa forma garanto a sobrevivência da minha espécie...

Pouco sutil o meu pensamento, não acham? Pois, acreditem se quiserem, esta é a única fidelidade na qual acredito. Todos se dizem ou exigem fiéis a pessoas, princípios ou dogmas: os maridos querem mulheres fiéis e as mulheres maridos fiéis, entretanto, foi feita uma pesquisa não me lembro onde mas recordo o essencial, isto é, os fatos, num hospital norte-americano através do exame de DNA. Foi retirado o sangue da mãe do bebê, do pressuposto pai e do pequeno, isto tudo comparado cientificamente. Constataram que tão somente sessenta e cinco por cento das crianças tinham com genitores os pais oficiais, os outros trinta e cinco só Deus e talvez as mamães saibam quem são. Claro que ninguém publicou o nome do hospital nem de quem eram os filhotes...

Exigem fidelidade os partidos políticos, entretanto, nesse vai-e-vem de cadeiras, sabe-se lá a que ideologia cada um daqueles pertence. Tem esquerda vestida de direita, direita fantasiada de centro, centro fingindo ser esquerda e daí por diante, numa valsinha infantil e nada inocente daquilo que chamam democracia.

Cobram fidelidade as religiões, excluem os indecisos, ameaçam os opositores, vestem de diabo qualquer um que não acredite tim-tim por tim-tim naquilo que pregam como verdade. Pregado foi Jesus na cruz, pregaram uma peça no padre, pregam pregos para formar e forrar escadas com longas travessas de eletrizantes deliríos (ou direi delitos?) até que alguns ou todos deixam de acreditar em tudo ou em algo... Ninguém é fiel nessa dúvida de existir ou não, como diria nosso velho Shakespeare, que Deus o tenha em sua glória!

Amigos não são fiéis, amantes não são fiéis, fortunas não são fiéis... Às vezes a miséria é a única companheira fiel, bem, mas quem quer tal companhia?

Pensando assim, resolvi ser fiel a mim mesma. Não que eu seja fiel às minhas crenças, pois à medida que ouço, vejo e leio vou aprendendo um pouquinho mais sobre a vida e me distanciando um pouquinho mais de minhas crenças originais. Não vejo mais o mundo com os olhos de dez, quinze, vinte anos atrás. O mundo de hoje, que me cerca, é tendencioso, cruel, malicioso. O de antes era tolo, ridículo, inocente talvez, como eu. Cresci e comigo evoluíram minhas idéias... 

A fidelidade que busco visa proteger essa evolução: como posso ser fiel a um marido se aparecer outro mais interessante em meu caminho? Ou fiel a uma religião se alguém me convencer de que existe outra melhor? Ou fiel a uma ideologia se ela me apresentar seu lado podre? Pior cego é aquele que não quer ver, pior infiel aquele que fica cego, mudo, surdo para manter uma fidelidade indigna...

Sou fiel a minha alma, nada angelical, que veio a esse mundo procurar um pouco de ajuste, tentando evoluir um pouquinho para, quem sabe, um dia virar anjo de verdade...

Fidelidade, meus amigos é coisa pessoal... Muito pessoal...

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