Atualização 062 - EM CIMA DO TELHADO
BIOGRAFIA
MINHA PANTERINHA PRETA
Ivone Carvalho
Até pouco depois do nascimento da minha filha Ana Cláudia, eu não gostava de gatos. Confesso que tinha medo deles. Sei que isso devia-se ao fato de vê-los matando os passarinhos que eu tinha quando era criança.

Lembro-me que chorei muito quando encontrei o periquito azul sem sua cabecinha, na gaiola. Pouco tempo depois, flagrei o canário do reino sendo rodeado por um outro gato, ou pelo mesmo, talvez, e passei, então, a vigiar a sua gaiola quase o dia todo, até que um triste dia, quando voltei do colégio nada existia além de penas amarelas dentro da gaiola. Resolvi, então, que não queria mais pássaros, mas, meu pai, nascido e criado no interior de Minas Gerais, não sabia viver sem eles, e, quando percebi, nossa casa já tinha mais de trinta pássaros, novamente. Porém, nessa altura já morávamos em outro local e nessa residência existia espaço para deixá-los longe do alcance dos felinos.

Depois de casada, quando mudamos do apartamento para esta casa onde moro, decidi voltar a tê-los, até porque, além de ser apaixonada pelos bichinhos, eu achava que as minhas filhas ficariam tão felizes quanto eu, ouvindo-os cantar, contemplando sua beleza, preparando ninhos para as crias.

Foi tudo muito bem até que os gatos da vizinhança os descobriram e, novamente, fui perdendo todos, um a um. Daí pra frente, percebi que o melhor lugar para ter os meus pássaros é nas árvores, livres, cantando alegres a sua liberdade, alegrando as minhas manhãs e finais de tardes, e podendo fugir ao menor perigo.

Bom, sem pássaros e com o amor e o carinho que a Aninha tinha pelos animais e, em especial por cães e gatos, acabei cedendo aos seus clamores e permitindo que ela trouxesse para casa um gatinho recém-nascido, para fazer companhia ao nosso cãozinho.

E, conseqüentemente, fui aprendendo a perder o medo, a gostar dos bichanos e hoje sou apaixonada por eles. Alguns dos que tivemos me arrancaram lágrimas quando morreram (por maldade pura dos meninos do condomínio) ou simplesmente desapareceram durante algumas de nossas viagens. Um deles, que ficou conosco por muito tempo e um belo dia sumiu, eu tinha a impressão de ouvi-lo miando o tempo todo e o chamava constantemente, mas creio que era apenas fruto da minha imaginação, devido à falta que eu sentia dele.

Porém, a campeã, a minha panterinha preta, a Jonie, é um membro da família. É filha de todos nós já faz sete anos. É uma gata elegantíssima! Estou falando sério! Ao caminhar, ela parece estar desfilando, tamanha a sua elegância no porte. Seus pelos negros, brilhantes. macios e sedosos, dão vontade de a gente ficar alisando-os o tempo todo. Sua meiguice, seu carinho, seu companheirismo, fazem dela a prata da casa. Não me considerem uma louca ou coisa que o valha, mas a pura verdade é que ela entende o que a gente diz, ela sente saudade de qualquer um de nós que viaje. Fica rodeando quem fica, miando e como que perguntando por quem está distante. Basta a gente perguntar pelo nome da pessoa ausente que ela corre na porta e espia a garagem. Aliás, quando algum de nós está chegando de carro, ela dispara para esperar na frente da garagem, observando o carro descendo a alameda.

Um dia destes eu não segurei os risos. Eu estava vendo um filme na TV e ela, deitada no meu colo. De repente ela deu um salto e saiu disparado para a garagem. Eu estranhei e fui ver o que era. Vi o carro da minha filha quase chegando em casa e ela sentadinha, bela e formosa, na ponta da garagem esperando pela chegada da Andrea.

Mas uma coisa sempre me despertou curiosidade. A Jonie, quando tem muita gente em casa, sejam visitas ou festas, pura e simplesmente desaparece. As primeiras vezes que isso aconteceu, chegamos a encontrá-la escondida sob a minha cama, no meu quarto (aliás, ela só entra no meu quarto se eu estiver sozinha lá, caso contrário ela fica esperando na porta e, se estiver lá comigo e perceber que alguém vem chegando, ela sai rapidinho).

Porém, encontrá-la sob a cama ocorreu apenas umas duas vezes e, depois disso, não tínhamos qualquer noção de onde ela se escondia até que as visitas fossem embora. E não tenha dúvida, ela sempre aparece quando restam apenas duas ou três pessoas de fora. Antes disso, não vem mesmo!

No Natal passado foi que eu descobri o seu esconderijo.

Eu estava me despedindo de algumas visitas, na garagem, e, assim que o carro começou a manobrar para sair, eu ouvi um miado. Chamei pelo seu nome, ela miava mais e eu não descobria de onde vinha. Até que resolvi olhar para cima. A Dona Jonie estava simplesmente deitada sobre o telhado da garagem, se enrolando e fazendo graça, para chamar a minha atenção. Ri, insisti para que ela descesse, mas ela não o fez. Aguardou ali até que saísse o último convidado, para só depois descer e entrar em casa novamente. Nem preciso dizer que, a cada visitante que eu acompanhava até o carro, lá vinha ela na pontinha do telhado, para novamente deitar-se, enrolar-se e miar para mim. 

Depois do Natal, todas as vezes que tenho visitas ou alguma reunião em casa e ela desaparece eu vou até o meu quarto, olho pela janela e lá a encontro, deitada em cima do telhado, esperando o fim da festa.

Não é para amar uma gatinha como a Jonie?

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