CHORO QUE FICA
Lula Moura

A emoção é lágrima que pinga,
num rio que transborda.
Às vezes riso,
às vezes chora.
E num "piscar de olhos",
na orla das pálpebras,
os cílios se permitem,
e se tocam...

Tem momentos na vida da gente que ficam marcados para sempre... Que nos remetem a uma viagem no tempo, e nos fazem refletir... Trazendo a sensação de um duplo filme, que vem à mente, nos levando ao passado e ao futuro.

***

(Aqui por perto, hoje menos pouco...)

Minha amiga é uma dessas pessoas independentes, de brilho próprio, que fazem a vida acontecer. Tem duas filhas: Luna e Mel. A vida corria e modificava a sua volta. Degraus iam ficando pra baixo, ainda bem. Uma porta se abriu e Mel, a filha mais nova, despontava uma carreira. A casa estava construída e Luna, a mais velha, iria se casar. Casamento de filha... Eu pensei em dar um presente pra minha amiga mas, "pra variar", estava sem grana. Pensei, então, em escrever alguma coisa. Quem sabe ela se engana, e gosta...

Pretensioso, invoquei os deuses da criação. Levantei os braços e Netuno tirou meus pés do chão (se é que eles estavam lá). Fiquei tentando imaginar como ela estaria se sentindo. Zeus permitiu, e eu assumi aquela personagem. Imaginei por um instante que eu fosse ela, minha amiga, e que estava numa praia riscando a areia com a varinha de condão, pensando no casamento da filha, enquanto as ondas iam e vinham, simulando passado e futuro... O texto veio, assim:

Lua de Luna (ou de Mel)...

O tempo passou, e eu nem percebi,
que hoje estou aqui,
"meio que" me despedindo
dela.

Já faz muito...

Ela chegou, de tudo eu fiz.
E eu gostei, e eu fui mãe.
E eu quero tanto,
e eu torço tanto,
que ela possa
e que ela faça.

Ela caminhou, de tudo eu fiz.
E eu gostei, e ela me disse,
acenando com os olhos:
- Fui, mãe.

Hoje,
quando ela estiver
caminhando em direção ao altar,
pensarei, por um instante,
na minha barriga, de ontem,
e na ilusão de um sonho
que também poderia ser meu.
E terei a certeza que,
de alguma maneira,
é uma parte de mim
que ali caminha
em forma de filha.

Hoje,
nem sei dizer o quanto,
mas um lado meu está feliz,
e outro está com medo
de sentir medo
do medo de ficar
sem ela.

É a sensação de ver
uma das razões
do meu relógio
se afastando.

Ah! Se ela soubesse!...

Busquei minha mãe
em pensamento,
pensei na música da Joyce,
e murmurei:
"-Ô mãe, me explica, me ensina,
me diz o que é feminina?
-Ô mãe, então me ilumina,
me diz como é que termina?"

As pálpebras cerraram
e minha mãe respondeu,
baixinho:
- Você saberá...
...que ela não é mais menina,
embora não consigas enxergar assim,
e nunca conseguirá...

Voltei pra mim,
e imaginei que hoje,
quando ela for para sua "Lua de Mel",
o meu lado Lua
queria que ela entendesse que,
sou tanto "de Luna" quanto "de Mel".
Mais do que de mim mesma...

As pálpebras cederam,
umedecidas e sorrindo.
Eu chorei sim,
mas de alegria!...

Vai filha, que eu tô aqui...

que eu tô aqui...

aqui...

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