MANIFESTO COR-DE-ROSA
Viviane Alberto

Ser mulher é gratificante por infinitos motivos. Vou citar dois pra ser sucinta. Primeiro: podemos manifestar aos quatro ventos nosso desejo de comer maria-mole. É verdade. Macho que é macho, não sai por aí dizendo que quer comer doces. Faz careta quando pedimos sobremesa. Enquanto saboreamos, deliciadas, nossa taça de sorvete, ficam olhando com aquela cara de ‘ai, o que eu não faço por essa gracinha’. Mas, na calada da noite, vasculham a geladeira da mamãe à procura de um restinho que seja do sagu de domingo. 

Tanto é que vivem inventando histórias com chantilly, mel e chocolate. Você pensa que é o prato principal e o cara tá de olho na sobremesa disfarçada. Ele te pede mais e você fica toda alegrinha. É quando ele estende o braço e enche a boca de calda de ameixa. Só calda de ameixa. 

E, o outro motivo, menos doce, mas tão gostoso quanto: mulheres podem ter chiliques. 

Somos sensíveis, somos nervosas. Um dia nublado já nos tira do sério. Fazemos bico. 

Alguém pega nossa vaga no estacionamento. Pra quê? Bate-boca à vista. Dona Maria é a mãe! 

O síndico reclama do latido da Flu-flu. Gritos sem sussurros. Vingança! Pisoteamos os jornais do vizinho reclamante. 

Pergunte se vamos sair com essa roupa, pergunte. Ameaçamos sair sem roupa nenhuma. Não, pior! Nunca mais sairemos de casa. Ficaremos trancadas, vivendo de pão diet e água. 

Está calor? Ai, meu Deus! Meu cabelo vai desabar! 

Está muito vento? Ai,ai,ai. Minhas unhas vão empipocar. 

O quê! Chuva! Nem pensar. Eu não saio de casa com essa capa horrorosa. 

Não quer assistir àquele filme iraniano, sobre a menina e seu balão? Tudo bem, ficamos em casa. Estou com febre, mesmo. E dor-de-cabeça. Muita dor-de-cabeça. Acho até que vou colocar umas batatas na testa. 

Se a empregada falta: TPM. 

O pneu do carro fura: TPM. 

O cachorro adoece: TPM. 

Levam nossos pitis tão a sério que, se matarmos alguém durante essa tal de TPM, temos atenuante na pena. Sim, somos legalmente alucinadas. 

Já reparou como vamos do riso ao choro, numa velocidade maior do que a da luz? 

Percebeu que, quando sorrimos, iluminamos até o lado escuro da Lua? 

Já notou que, quando choramos, podemos resolver momentaneamente a questão da seca no nordeste? 

E todos esses ataques, chiliques e síncopes são a mais sincera expressão do que estamos sentindo. Mulheres não sabem esconder sentimentos. Daí gritamos, sapateamos. Gesticulamos mais do que italianas in natura. 

Por isso infartamos menos, por isso vivemos mais. Porque não passamos a maior parte da nossa vida jogando um xadrez sem regras, entre nossa cabeça e o coração. Talvez por acompanhar (por dentro) o desenvolvimento da vida, aprendemos desde cedo a dar mais valor a ela. E o modo como ela passa depressa, deixando recados ao redor dos nossos olhos. 

Lambemos nossas crias, idolatramos nossos homens. Trocamos sem hesitar o singular pelo plural. Usamos a terceira pessoa indiscriminadamente. 

Sentimos saudades. De tudo e rápido demais. 

Mas não assumimos que somos diferentes. Porque há muito tempo pedimos igualdade. Porque a Joaninha morreu em chamas. Porque a Olga virou livro. E tantas anônimas estão aí, pra não me deixar mentir. 

É, somos loucas. Incomodamos. Talvez por não sabermos fingir que tudo está bem o tempo todo. Ou mesmo por não fecharmos a boca , nem por um segundo, durante o futebol. E nunca na vida entender o que é um impedimento. De propósito. 

Mas nossos hormônios nos traem, meninos. E sempre acabamos precisando de vocês pra alguma coisa. Pode ser pra compartilhar uma tarde maravilhosa. Ou pra ir comprar maria-mole. 

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