LIBERDADE ACORRENTADA
Juraci

Coitado!

Foi mesmo acorrentado! Logo ele que ficava alegre quando conseguia escapulir da sala quadrada, quente e abafada. Vez em quando um ventilador preguiçoso, abanava o leque no seu traseiro arrepiado.

Um alívio, um frescor. Como se não bastasse essa temperatura elevada, acorrentaram o pobre infeliz. Tão pequenino! Tão indefeso! Quem o vê quieto no seu canto, não imagina a sua utilidade quando está em serviço. Inofensivo. Operante. Auxilia o professor, o aluno e todos, na organização do trabalho, das tarefas. Foi acorrentado sem dó nem piedade. Não mais poderá passar de sala em sala, de mão em mão e até, vez por outra, se colorir com a marca pequenina do batom da menina vaidosa. Enquanto ela preparava as folhas do papel para ele grampear o seu beijo, sentia o perfume que exalava do seu seio ereto e rígido. Mas, ele está triste, muito triste. Não mais ouvirá a voz macia da professora modelo, de cabelos negros, ancas apetitosas e nem a voz áspera do professor careca. Foi mesmo lhe tirado o direito de ir e vir, de sentar sobre as carteiras como se fosse um aluno a mais, na sala de aula. Agora, ele procura a liberdade que lhe foi negada. Não sei porque, todos querem usar e abusar dos mais fracos, dos menos favorecidos. Cada um quer desabar suas fraquezas, suas mágoas, suas derrotas ou mesmo acorrentar sua debilidade naquele que não tem boca ou espaço para gritar.

Acorrentando, acorrenta-se a liberdade. Até mesmo de um velho grampeador de secretaria. 

Procura-se alguém com poder para desacorrentá-lo. E que seja breve, antes que o dia dos testes chegue. Que o vento não jogue escada abaixo, folhas desgrampeadas, fazendo um verdadeiro coquetel, para a farra dos alunos. 

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