DETALHES
DE UMA LINGERIE

Patricia Zayat

Arrancou a borboleta da calcinha que vestia e estendeu o braço:

- Toma. Pra você se lembrar de mim. 

Ele não entendeu o gesto mas pousou o pequeno pedaço de fita sobre a cômoda. Aos 22 anos, pouco acostumado à quantidade de sexo que ela lhe oferecia, estava mais interessado naquele corpo que em delicados detalhes de uma lingerie. No entanto, se por um lado ele inaugurava algo que enfim pudesse ser chamado de “vida sexual”, por outro deveria acostumar-se às sutilezas de uma relação amorosa. 

Especialmente em sendo a primeira namorada Beatriz. A idade era a mesma. O currículo sentimental não. Os pais já tinham dificuldade para decorar o nome do atual namorado, tantos os que passaram por aquele sofá. Os términos, porém, não lhe faziam menos passional. Ela não “ficava”. Se envolvia. Por isso nunca esquecia a data do primeiro beijo, da primeira transa e a música de cada um dos amores vividos. Os cheiros, os sabores e as manias eram sempre únicos porque sempre estava apaixonada e via tudo com olhos de quem vê pela primeira vez. O amor para Beatriz era tão belo quanto uma borboleta feita de fita. 

Por oito meses foram felizes. Trocaram apelidos, inventaram códigos incompreensíveis para o resto da humanidade, amaram-se ao som de Tom Jobim. Freqüentaram cinemas, trocaram e-mails, encontraram-se na Praça das Nações. Declararam-se, apesar da timidez dele. A borboleta sempre guardada numa gaveta do armário. Guardada não, escondida. A mãe, única presença feminina da casa, se a encontrasse na certa saberia que voando aquela borboleta não havia de ter vindo. E a vida dele, “era apenas dele”, como costumava dizer nos dias mais solitários. Havia também dias solitários. 

No fim restaram apenas lágrimas e devoluções. Nada além de livros, revistas e CDs. Da borboleta nunca mais teve notícia. Ela até ponderou que, depois de alguns desentendimentos, não fazia sentido ele lhe telefonar para devolver um pedaço da sua lingerie. O que ele faria com a borboleta, se jogaria fora, se ficaria esquecida no fundo da gaveta, já não era problema dela. Impossível imaginar-se entregando a mesma borboleta para um novo amor.

Talvez seja por essas e outras que Beatriz anda sendo vista em lojas femininas. Com pequenas sacolas ela cruza as ruas da cidade com a leveza típica das borboletas.

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