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Lena Chagas

Foi assim, de repente. Alguns mal-entendidos, poucas palavras, nenhuma explicação. O fato é que doeu; mais pelo silêncio que pela atitude. Ficou aquela sensação de culpa sem se saber exatamente de que, e a impressão de história inacabada, mal resolvida. 

Todas as tentativas de fazer contato foram inúteis; telefonemas, cartas, e-mails, até recado em jornal - numa chamada em negrito na sessão de Achados e Perdidos. E nada! Precisava esclarecer, perguntar e saber o motivo, ainda que machucasse mais. Tinha de retomar o curso da vida.

Fazia muito frio e a chuva fina parecia atravessar os ossos. Estávamos quase chegando em casa e o clima dentro do carro, quase congelando. Sinal fechado, tumulto e sirenes no cruzamento. Acidente grave. Não tinha como voltar. Nenhum desvio. A espera e o silêncio aumentaram ainda mais o mal-estar. Num gesto repentino, ele abriu a porta e se foi. 

Não voltou nem mandou buscar suas coisas. Não houve dia seguinte, nem queima de fotos, nem arrumação de armários, nem malas prontas. Tudo parou naquela noite, naquele sinal. 

Amigos não traziam notícias, ninguém sabia, ninguém viu. Evitavam ou desviavam o assunto. Muitos invernos vieram, mais frios, mais longos e tão vazios que esvaziavam também os meses das flores e os verões. Pouco ou quase nada me fazia prosseguir.

Até que, numa tarde iluminada de outono, num sinal fechado qualquer, um olhar parecia saltar do retrovisor. Num segundo, o reconheci. Olhei pela janela esperando um gesto, uma palavra ou um cumprimento, mas vi um olhar vazio, mais frio que todos os invernos que haviam passado. 

O sinal abriu. 

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