OBSESSÃO
Rita Alves

Para aquela moça de olhar perdido não existia nada pior do que a solidão. Havia acabado de levar um fora do namorado e não entendia os motivos. Achava que tinha feito tudo certo. Não ligava pra ele todos os dias, procurava não importuná-lo com o ciúme quase doentio que sentia, concedia toda a sua atenção e jamais sequer levantou a voz, mesmo quando ele não tinha razão. Seu comportamento com o namorado era totalmente diferente daquele dispensado às outras pessoas. Ela dissimulava bem suas emoções. Morava sozinha num pequeno e aconchegante apartamento e gostava de parecer uma mulher forte, independente, decidida, e era bem convincente. Bastava um olhar para que todos a respeitassem e ficassem totalmente subservientes aos seus pedidos. Até a sua voz impunha superioridade. Mas na solidão do quarto as coisas não eram bem assim, chorava todas as noites, ainda mais agora que estava sozinha. Certa noite, desabou num choro tão barulhento que alguns vizinhos foram bastante insistentes ao tocarem a campainha do seu apartamento, pois estavam preocupados com as lamúrias que se faziam ouvir no prédio todo. No dia seguinte, diante dos olhares curiosos e apesar da vexação de encontrar alguns vizinhos no elevador, ela empinava o nariz e fingia que não havia acontecido nada. Assim era Margot, frágil e insolente.

Na ida para o trabalho, implorava aos céus para que seu dia terminasse bem, chegava no escritório imaginando o momento de pegar a bolsa e ir embora. Ainda tentava imaginar onde havia errado para ter perdido o homem que durante algum tempo ela imaginou ser o amor de sua vida. Perguntou isso a ele, claro, mas a resposta foi tão imbecil que preferiu esquecer. Passou dias remoendo aquela dor e revivendo as cenas de amor, mescladas ao dia fatídico que ele resolveu abandoná-la. Ela o enxergava como um homem perfeito, mas não havia como negar que, não raro, ele era grosseiro e costumava ter ataques que beiravam a histeria, Margot era comedida e tentava acalmá-lo sempre que ocorriam esses devaneios. Essas lembranças a deixavam ainda mais indignada, jurava que ele não encontraria na face da Terra, moça tão generosa e compreensiva quanto ela. Sentia ódio diante de tanta injustiça e não encontrava alívio em nada. Saiu com os amigos, conversou, tirou trinta dias de férias em outra cidade e aquele sentimento foi ficando ali, lancinante e cada vez mais presente. Desejava vê-lo, tocar seu rosto, precisava beijá-lo desesperadamente. Chegou até a comprar uma arma para dar cabo da vida e foi aí que percebeu que estava ficando doente e resolveu procurar ajuda, pois se alguém tinha que morrer, certamente não era ela. Foi uma longa e tediosa terapia. Margot não se conformava em demonstrar sua fragilidade nem para o psiquiatra, o que evidentemente causou vários transtornos. É certo que não houve nenhum resultado prático com a terapia, pois num dia qualquer, caminhando pela rua, encontrou com o ex-namorado acompanhado por uma moça não mais bonita do que ela. Seus olhos até brilharam, Margot esperava por esse encontro há meses. Sorriu para ele, enfiou as mãos dentro da bolsa e sacou tranqüilamente a arma. Descarregou todo o seu ódio e o que se viu no chão foi um corpo cravado de balas.

fale com a autora

Para voltar ao índice, utilize o botão "back" do seu browser.