DOMINGO
Ana Terra

Sexta-feira. Espero pelo domingo. Sinto-me vapor disperso. Estou em todos os cantos e em lugar nenhum. Preciso de um alicerce para uma obra utópica. Não há nada agora. Somente uma plataforma de cimento onde fixo meus pés.

De cima da mesa o ponto zero me olha em silêncio. 

Sinto-me difusa. Queria, ao menos, estar confusa. Mas estou nada. 
O passado me abandona. Os acontecimentos e imagens desintegrados pelo tempo. Pelo vento. Pela vida.

Saio engatinhando da caverna escura. Com a visão comprometida pela intensidade da luz.

Mas o domingo está chegando. Lentamente. Talvez a poucas quadras daqui. Como estará sua expressão? Vaporosa como a minha?

Não usarei pontos de interrogação. Não entrarei em devaneios ou indagações.

Terça feira, ao abrir a janela, vi apenas uma estrela. Envolvi-me na textura da uma conversa interior. Sentei-me aos seus pés e acompanhei seus movimentos suaves.

Ouvi seus delírios e a promessa do domingo. As rosas estampadas na poltrona ganharam vida. Úmidas e macias. Vi olhos molhados. Preocupados com a profundidade de um poço, talvez.

Mas...Espero pelo domingo. Sem esperança. Sem lembrança. Sem expectativa.

Não estremecerei ao ouvir sua chegada. Não farei perguntas. Serei o nada abrindo a porta. Um nada insano querendo aprisionar o vapor.

Domingo...

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