MOLECAGEM
Caio Beraldo

- “Ôuououououou, futebas!”, gritava Carlinhos, com a bola na mão na porta da minha sala. A turma deles estava com uma aula vaga, então decidiram ir pro ginásio jogar futebol. Rapidamente quem até então prestava atenção na aula fazia os cálculos que só quem já passou por isso pode entender: pesavam o número de faltas com a nota que precisariam para aquela matéria, entre outras variáveis, e então decidiam se juntavam-se ou não ao jogo em plena terça feira às nove horas da manhã. Os times então eram formados. Dez minutos ou dois gols. Alguém lembrou da última aula? Claro que não...

Há dois anos a faculdade havia colocado muros em volta do terreno, fechando o acesso dos alunos aos bares próximos. A rua lateral, antes tão movimentada, estava deserta. Ou quase. Numa sexta feira quente, ninguém se importava em andar quase dois quilômetros pra tomar uma cerveja com os amigos e comemorar a chegada do fim de semana na Casa da Fogazza, o único bar que mantinha-se em pé. Depois das aulas (se bem que na maioria das vezes o pessoal nem esperava as aulas acabarem) era uma festa: tomávamos cerveja, depois íamos pras quadras da faculdade jogar bola, e depois voltávamos pro bar pra matar a sede. Algumas vezes a festa atravessava a madrugada.

Sabadão, dia de balada! Combinávamos tal hora em tal lugar. Durante a semana tinha cara que assistia às aulas de cueca samba-canção, chinelo e camiseta regata. Na balada, todo mundo arrumadinho, na esperança de ficar com alguém legal. De nada adiantava: quando alguém conseguia chegar em alguma menina os grandes amigos apareciam para destruir qualquer clima. Isso é que é amizade!

Uma vez por bimestre, mais ou menos, rolava um churrasco na casa de praia do Osama, em Bertioga. Era uma farra: churrasco, cerveja, futebol, mulherada, risadas, altos papos, muita música, noites em claro, piscina, praia, balada. Alguém lembra do que ficou lá em cima da serra? Só caíamos na real quando acordávamos na segunda-feira e íamos de ressaca pra faculdade. Mas tudo bem, reservávamos a primeira aula inteira pra dormir e descansar.

Apesar de tudo isso nunca ninguém se descuidou dos estudos. Ficamos deprimidos, chateados, preocupados. Passávamos horas estudando em épocas de prova, apesar de interrompermos o raciocínio com coisas imprescindíveis como contar piadas e fazer guerras de bolas de papel. Mesmo assim, durante os cinco anos naquele lugar, “perdemos” apenas dois amigos, reprovados, que passamos a ver raramente devido aos horários malucos.

Naquela torrente de preocupações com a vida acadêmica encontrávamos tempo para viver. Infantilidade? Molecagem? Imaturidade? Não sei. Só sei que bons foram os anos na faculdade. Bons não... inesquecíveis.

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