O CANDIDATO ADÃO
Ronaldo Torres (Tom)
 

Que graça tinha o Paraíso afinal? Viver assim, sem ouvir a Voz do Brasil, sem assistir as Pegadinhas do Faustão ou decidir a sorte dos participantes do Big Brother Brasil tinha graça? Adão, apesar da beleza sensual de Eva, vivia triste e angustiado, em graves crises existenciais, em múltiplos conflitos interiores, questionando o ser ou não ser filho da macaca e, por isso, vivia azucrinando o juízo do seu psicanalista.

Deus, cansado da anarquia reinante em seus domínios, convocou eleição direta para eleger os constituintes que iriam fazer a primeira Constituição do Paraíso, um código de conduta para a macacada, leãozada, toda bicharada e os seus dois rebentos feitos à sua imagem e semelhança. Era hora de botar ordem na casa: elegeria também um presidente ao qual todos se reportariam e deveriam obediência.

Adão se candidatou a presidente. A conselho dos seus marqueteiros, andou de jegue, comeu buchada de bode e desfilou vestindo camisa de um time de futebol muito famoso. Apresentou Eva como candidata à Constituinte, contrariando o Todo-Poderoso, que achava a sua criação de uma costela de Adão um tanto feminista, de idéias independentes e subversivas e fatalmente poria o Paraíso em Suprema Revolução.

Nos comícios Adão mostrou sua verve de político competente. Prometeu mundos e fundos, prometeu o paraíso, defendeu o parlamentarismo, reforma agrária, distribuição de renda e total proteção aos descamisados. Em várias ocasiões apareceu abraçado ao Frei Damião e, para gáudio da macacada, seu último comício fora animado pela banda Chiclete com Banana.

Porém, como diz o ditado, "de urna eleitoral, cabeça de juiz e de técnico da seleção brasileira ninguém sabe o que é que vem", Adão foi fragorosamente derrotado, apesar de ser o único eleitor votante. Eva não votava. Naquele tempo lugar de mulher era na cozinha.

- Houve fraudes das grossas! - murmurou revoltado o primogênito de Deus - Bem que me disseram para não confiar nessas urnas eletrônicas brasileiras!

Com dívidas de campanha acumuladas até o pescoço, devendo a Deus e ao mundo, com os empresários e diretores de bancos estaduais em seu encalço, ele não via outra saída senão o suicídio. Eva, que também não fora eleita constituinte, se sentia até aliviada por não ter que presidir as ações sociais do Governo. Vendo a angústia e o abatimento do marido, sentiu uma imensa pena dele. Deitou-o em seu colo, alisou a sua cabeleira e o induziu a procurar Deus e exigir uns três ministérios, sob pena de instituir um governo paralelo.

E mais tarde, tarde da noite, em uma reunião secreta com os seus candidatos a ministros, Adão comeu uma maçã oferecida pela serpente. Comeu duas. Comeu três. Bebeu vinho do Porto e tomou duas talagadas de Conhaque de Alcatrão de São João da Barra e, um tanto bêbado, matou a cobra e mostrou o pau para Eva. E ela, toda dengosa, toda melosa, toda derretida, toda no cio, arfando no peito virgem um grito incontido de "É hoje! É hoje!", se aproximou dele naquele estado em que, se paredes houvesse, diria: "Tô subindo pelas paredes!" e Adão, metido a gostoso, todo precavido, quando Eva tocou seu corpo com suas mãos delicadas, tirou o corpo fora e exigiu:

- Só se for de camisinha, meu bem!

A macacada, que a tudo assistia em silêncio, escondida entre a folhagem, ensaiou um coro estrondoso que retumbou Paraíso adentro:

- Bicha! Bicha! Bicha!

Eva, depois de muitas considerações a respeito, decidiu partir para o adultério com um gorila assanhado que vivia rondando o seu terreiro, lhe dizendo gracinhas e lhe chamando de gostosa! Na primeira vez fez tchan! "Quem não tem Adão caça com macaco!", se justificou. Na segunda fez tchan-tchan! "Quem não tem tu, vai tu mesmo!" - disse. Na terceira vez... bem, na terceira vez a Johnson & Johnson havia inventado a camisinha e aí ela pegou Adão e... tchan-tcan-tchan-tchan!.

Moral da história: Se é que gorila é macaco, então não há o que se discutir sobre a origem do homem.

 
 

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