LEMBRANÇAS DE VERÃO
Vera Vilela
 

Podia ver através do pára-brisa, ao longe, o azul infinito da mistura: céu e mar. O aroma invadindo minhas narinas e me arrepiando.

- Como é bom estar de volta. Eu e o mar! - pensei.

Não resisti. Parei o carro, saí, tirei minhas sandálias e corri em direção à praia.

O contato com a areia fina e quente me excitou, uma onda veio, me cumprimentou e molhou a barra de minha saia. Sorri!

- Ah! O Mar! Sempre ousado.

Limpei a areia dos pés e terminei meu trajeto. Lá estava a pousada! Uma construção antiga, toda de madeira, ladeada com varandas enfeitadas por gerânios. Na porta a mesma placa entalhada em madeira: Bem Vindos!

- Verônica! Quanta saudade menina! - disse a dona e gerente deste cantinho maravilhoso.

- Estou ótima e cheia de saudades também! Meu quartinho está reservado dona Rosa?

- Claro que sim! Aquele com janela para a praia, troquei roupa de cama e banho, tudo limpinho e cheiroso como gosta. Está sozinha?

- Sim! - respondo, cabisbaixa, e ela percebe que não quero tocar no assunto.

Entrei no velho e conhecido quarto.Tudo como eu sempre gostei: lençóis e toalhas brancas e cheirosas, um vaso com cravos brancos que perfumavam o ar. Fui então tomar uma ducha fria e coloquei meu biquíni, apenas por coincidência ele era também - branco. Deitei-me e fiquei por instantes sentindo o ar fresco da manhã sobre meu corpo seminu. Acho que cochilei porque logo em seguida ouvi:

- Verônica! O almoço está na mesa.

- Nossa! Que fome!

O restaurante continuava simples como antes, mesas e cadeiras rústicas, apenas uma cerca de madeira o separava da praia e de cobertura um grande telhado de sapê. Na mesa meu prato preferido: peixe frito em tiras com arroz branco, molho de camarão, salada verde e água de coco. Enquanto saboreava meu almoço observei chegar um homem alto, cabelos grisalhos, olhos verdes, um ar aristocrático que em nada combinava com seu vestuário - bermuda, chinelos e peito nu, aliás, um peito forte e malhado. Ele conversa com Rosa - a gerente - e se encaminha com a chave do quarto em mãos. Pela bagagem deverá ficar alguns dias. Dou uma piscada para Rosa, que logo entendeu, se aproximou de minha mesa e disse:

- Nem precisa dizer Verônica, se chama Augusto e vai participar de um Congresso Médico na cidade.

- Médico é? Hummmmm! Qual será sua especialidade?

- Verônica! Aí já é querer saber demais.

Fiquei com aquela imagem em minha cabeça. Que homem atraente! Que olhos! Que peito! Achei melhor tomar um banho de mar para refrescar, afinal, estava ali para descansar e curar as mágoas da minha última paixão. A praia estava semideserta, era quase particular, só ficavam aqui mesmo as pessoas que se hospedavam na pousada. Coloquei minha esteira na areia, na sombra de um coqueiro e fui até o mar! A água estava uma delícia e o mar tranqüilo. Entrei mais um pouco e mais um pouco, pois, quase não tinham ondas na enseada naquele dia. Resolvi dar um mergulho e nem percebi a onda que repentinamente se aproximou e me puxou me fazendo girar por várias vezes na água, como uma presa fácil.

Não conseguia achar o chão ou visualizar o céu. Sentia a água entrando em meus pulmões a cada tentativa de respiração. Logo após senti braços me segurando e me levantando, respirei fundo e comecei a tossir. Aos poucos cheguei a praia pelos braços fortes de...

- Quem é você?

- Me chamo Augusto, e você?

- Verônica cof...cof...cof...

- Meninas não deviam brincar sozinhas no mar, sabia?

- Oras! Foi tudo uma armação para ser salva por você!
- Não me diga? Então fui vítima de um sórdido plano seu? Como fui tolo! Hahahahahaha!

Quando Augusto riu, meu coração disparou. Aquele homem era realmente um príncipe! Ele me convidou para um passeio de carro e aceitei. Andamos na cidade toda e ela me comprou um chapéu de praia vermelho - disse que era para que ele me visse de longe caso precisasse de novo salvamento. Combinamos de jantarmos juntos na pousada. Fui para meu quarto e tomei um banho gelado. Laveis meus cabelos e escolhi um vestidinho gostoso de seda florida. Cheguei ao restaurante ainda com os cabelos molhados e a brisa gostosa invadindo toda a varanda. Augusto chegou em seguida, novamente de bermuda e chinelos. Podia se perceber que ele vivia sempre muito vestido e aqui não queria saber de muita roupa.

- Boa noite sereia afogada! - disse rindo.

- Boa noite príncipe bombeiro!

Comemos algo leve que nem me lembro direito e fomos caminhar um pouco a beira mar. Ele pegou em minha mão e disse que era para não correr o risco de me perder ou entrar novamente no mar. Me contou sobre sua vida, sua profissão. Era pediatra e estava saindo de um casamento de quinze anos. Contei-lhe sobre minha vida e meus desamores. Nos sentamos numa pedra e ficamos ali conversando, olhando o mar e, repentinamente ele segurou em minhas mãos dizendo:

- Verônica! Não consigo esconder, você me atraiu demais. Quando a vi no mar com aquele biquíni minúsculo, meu coração deu um pulo e um giro de 360º. Fiquei caidinho por você.

- Seria lugar comum se eu disser o mesmo? Quando entrou na pousada senti que nos conheceríamos melhor.

Quando eu disse isso foi o mesmo que dar-lhe autorização para invadir minha vida. Ele se levantou, me puxou, abraçou-me e delicadamente roçou seus lábios em minha testa, olhos, nariz, face e, finalmente minha boca. Entreguei-me ao seu beijo com volúpia, esfregávamos boca e corpo simultaneamente, deixando que nossa libido encaminhasse nossos atos. Suas mãos indecentes alisavam o liso tecido de meu vestido ao mesmo tempo em que o tirava. O momento foi mágico, mãos alisavam, apertavam, seguravam e nos faziam gemer. Na devassidão daquele momento nos entregamos de corpo e logo em seguida de alma. Deitados, nus, naquela areia ainda morna nos fizemos juras de amor eterno. Passamos sete dias de plena paixão e entrega. Durante o dia ele se dedicava às suas palestras e, durante a noite nos amávamos cheios de ternura, tesão e paixão. Parecia que nada no mundo poderia nos separar tamanha era nossa sintonia, tanto intelectual como sexual.

Chegou então o dia da despedida. Não havíamos feito planos para o futuro, apenas juras comuns de um casal que se atrai. Quando acordei percebi que Augusto não estava ao meu lado. Imaginei que devia ter se levantado cedo para arrumar malas, afinal, era o dia de sua partida. Aguardei deitada até perto das dez hortas da manhã e ele não apareceu. Resolvi então ir até a recepção falar com Rosa.

- Bom dia dona Rosa! Onde está meu médico?

Percebi que Rosa desviou o olhar para não demonstrar a piedade que dela se apoderou.

- Verônica, minha filha, ele partiu bem cedo!

- Me deixou uma carta, um recado, qualquer coisa?

- Não!

Aquele "não" bateu como uma pancada em minha cabeça e coração. Senti as pernas bambas e me sentei. As lágrimas teimavam em correr pelo meu rosto.

- Não é possível! Dessa vez não! De novo nãooooooooooooooooo!

Segurei meu rosto molhado com as mãos, cotovelo na mesa e chorei, acho que por mais de uma hora, com o braço de Rosa me enlaçando, porém, respeitando minha vontade de silêncio. Levantei-me, fui até o quarto, arrumei minhas malas e fui, sem destino, sem horas, sem vontade. Quando estava já na saída da cidade meu celular toca, é dona Rosa, com certeza preocupada da forma como saí.

- Verônica! Volte rápido! Você esqueceu uma coisa aqui!

Eu mal tive tempo de dizer que não me importava e ela já havia desligado. Estava ainda tão perto que resolvi voltar, aproveitaria e me despediria corretamente dela.

- Me perdoe dona Rosa, eu saí como uma garota mal educada, me dê aqui um abraço!

- Claro minha linda! Mas, antes, veja: chegaram essas flores para você assim que saiu, com um cartão.

"Minha doce Verônica:

Se estiver disposta a ser minha para sempre venha me encontrar no endereço abaixo, não me despedi porque não suportaria ouvir seu não. Caso seja esta sua resposta apenas não venha e eu entenderei que tudo não passou de apenas mais um amor de verão.

Seu
Augusto"

 
 

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