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Regina Souza
 

O tema "DE CORPO E COPOS" parece sugerir um corpo, portando um copo no prolongamento de cada um de seus braços, as mãos.

Só que a coisa não é assim tão simples, muito menos para alguém virginiana como eu, fidelíssima à praticidade que o signo me confere.

Juntos, corpo e copos poderão formar um belo e especial conjunto, dependendo do tipo de relação que um tiver com o outro.

Vejamos que, se o corpo estiver cansado da vida que leva e se o cérebro que o gere estiver lotado de problemas indissolúveis e, também e principalmente se os dois não estiverem sendo utilizados com prudência por seu dono, poderão se transformar em algo rigorosamente perigoso.

Evidentemente, dependendo também do que estiver contido no copo, o conjunto "corpo-copos" chega, via-de-regra, a extremos inimagináveis.

Meu corpo não reage bem á ingestão desses líquidos e, por respeito à minha natureza, deixo-o livre dos efeitos alucinógenos que o álcool gera na maioria dos seres humanos.

Meus copos? Esses, eu encho de líquidos variados, contanto que não contenham o famigerado álcool em suas fórmulas.

Até aí, tudo bem, mas há um porém: o efeito do álcool ingerido por outros, desde sempre me atingiu.

Isso mesmo. Sou uma inocente alcoólatra passiva e ninguém me defende!

Já na tenra idade, lá pelos meus dois ou três anos de vida, adquiri tamanho medo de águas profundas que até hoje sinto verdadeiro pânico quando me deparo com muita água junta, graças a um tio torto -pelo distante parentesco que nos unia e muito mais pelo tanto de álcool que ingeriu naquela fatídica manhã de verão praiano - que resolveu se divertir às minhas custas, dando-me caldos homéricos.

Salva por meu pai-herói das mãos daquele parente-monstro-bêbado, vejo-me até hoje enfrentando situações igualmente perigosas quando, por exemplo, amigos alcoolizados teimam em dirigir seus carros, colocando minha vida à mercê de sua falta de responsabilidade.

Em outras situações sou obrigada a assistir e às vezes até a participar de cenas deprimentes, como brigas com ou sem agressão física entre pessoas alcoolizadas. Elas não medem nunca o que dizem e saem atacando o mundo à sua volta, além de nunca se lembrarem do ocorrido no dia seguinte ao porre.

De situações constrangedoras participo, quando presencio gente caindo, se expondo gratuitamente e chegando a lamber chão, poste ou qualquer coisa que encontre pela frente.

Noutras, sou ofendida quando tenho que ouvir provocações absurdas e acusações infundadas de bêbados conhecidos ou até dos desconhecidos.

Abusam de minha flexibilidade, quando me atingem com sua falta de discernimento, aquela que os leva a invadirem a minha carteira, por desconsiderarem o fato real de que a conta de quem não bebe é infinitamente menor do que a de quem bebe todas.

Propiciam também situações desrespeitosas e, mesmo sendo pessoas em quem confiei e a quem dediquei anos de amizade, saem bebendo o mundo, deixando pra lá tudo que foi construído por nós durante anos e, a cada porre, vão detonando a minha vontade de continuar a investir no contato.

São preconceituosos e antidemocráticos quando excluem os não adeptos do álcool de seu grupo, apenas e exclusivamente na hora do "beber junto", como se todo o resto nada significasse.

Por tudo isso, venho fazendo muita, mas muita força mesmo para tentar entender a voracidade com que os "não fumantes" vêm atacando os fumantes, como se o fumo fosse o único vício prejudicial à nossa sociedade. Eles, os alcoólatras, resolveram aderir à ferrenha campanha contra os fumantes e, como se viciados não fossem, entram nos bares pedindo uma dose em alto e bom tom e esticam seus olhinhos vermelhos -ainda pelo porre da véspera-, à procura de uma mesa em área para não fumantes. Daí pra frente, qualquer indivíduo que estiver no mesmo recinto, terá que suportar seus corpos portadores de copos e, qualquer coisa líquida ou sólida que jorrar daquele canto deverá ser aceita em silêncio e civilizadamente por todos aqueles que não são adeptos da violência.

Como pode alguém como eu, fumante consciente, com pleno conhecimento dos efeitos que essa droga causa em meu corpo, adulta, cidadã correta e responsável por todos os meus atos, alguém que nunca fumou em casa onde não houvesse cinzeiro à vista ou sem autorização do anfitrião, alguém que nunca fumou em filas de espera, mesmo antes do surgimento da tal lei que proíbe fumar em recintos fechados, se acostumar a conviver com esses corpos amolecidos, seguradores e entornadores de copos cheios de álcool, sem dar um pio?

Então, pelo direito que me foi oferecido legitima e gratuitamente pelos que atacam indiscriminadamente os fumantes, convido você - meu fumante e não alcoólatra amigo - a participar comigo da:

"CAMPANHA PELA DEFESA DO ALCOÓLATRA PASSIVO"
-meu livre arbítrio de volta, já!-

 
 

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