MAGDALENA
Francisco Pascoal Pinto de Magalhães
 
 

"rabi, andei em pecado", confessou magdalena com a voz trêmula e os olhos verdes marejados - as madeixas, longas, enxugavam os pés úmidos do mestre que ainda há pouco cruzara as águas salgadas do mar morto.

ora, ponderou o mestre, a carne era fraca e magdalena a única mulher naquele pelotão incumbido de proteger as rotas de abastecimento do kibutz ephraim, ao norte de gaza.

magdalena não era nenhuma miss. já entrara na casa dos trinta. estava acima do peso e via-se que perdera o viço sob o sol causticante da galiléia. seu crime, manter relações com os companheiros de arma. às vezes até com dois deles ao mesmo tempo, na mesma tenda - que o sexo aliviava as tensões daquela guerra brutal que não terminava nunca.

os oficiais judeus ortodoxos a levaram a um tribunal militar sob acusação de promiscuidade. e o mestre, que também era notável advogado, mas que não andava tão criativo por aqueles dias, fez suas as palavras de outro mestre, o nazareno, para defende-la :

"que atire a primeira pedra quem nunca errou"

fácil. sem réplica nem tréplica. não houve como não absolve-la.

na tarde do dia seguinte, porém, quando patrulhava um trecho isolado junto a uma pedreira, magdalena ouviu uma forte explosão. dinamite pesada nas encostas da colina - ela havia parado para descansar sob uma tamareira e tirara o capacete para arrumar o coque feito com suas longas madeixas. as explosões na pedreira eram rotina.

lá do alto, como um cometa cinza, uma pedra do tamanho de um punho fechado riscou o ar e atingiu-a em cheio na fronte matando-a.

o mestre rezou por sua pobre alma. os oficiais ortodoxos falaram de alguma coisa sobre justiça divina. os guerrilheiros do hammas assumiram a autoria do atentado. os soldados do pelotão, esses, andam tensos, muito tensos.

 
 

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