ÍNTIMO
Francisco Pascoal Pinto de Magalhães
 
 

relacionam-se ainda. e não somente pela obrigatoriedade daquele contrato formal firmado por conveniência, a custo de um dote, numa data da qual já não se lembram. dos nomes, porém, restam lampejos: selmariadeliana? uteroscardiogenésio? luisabelisadoralicelina? ernestomássimodesto? carolinadiana?

nomes. dá-se nome a tudo. aos bois. aos homens de boa vontade ou de má índole.

"pode me chamar do que quiser; eu continuarei a ser o mesmo", parafraseou o monge-gafanhoto e ela nem deu-se ao trabalho de rir.

e como se fosse fábula metamorfosearam-se instantaneamente em insetos alados e vorazes e copularam ali mesmo, na sala de estar daquele apartamento vazio, sem o testemunho indiscreto e sólido de uma mobília que os desestimulasse; e com a total anuência do corretor de imóveis que lhes cedera as chaves do inferno e do céu. dir-se-ia que se esvaíram em espasmos de gozo e transe como se o prédio estivesse condenado e fosse ser implodido nos próximos cinco segundos. não tinham como saber: condenados estavam eles.

atiradas num dos quatro cantos, suas roupas sonhavam poder flutuar no vão vertical das habitações qual bandeiras íntimas impregnadas das secreções de que lhes esvaziava a alma.

 
 

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