VISÃO DIFERENTE
Gaby Marques
 
 

Olhos tristes, olhos sem brilho, sem esperança. Foram com esses olhos que me deparei numa manhã de outono.

Ele estava em frente a uma barraquinha, perto da rodoviária. E, aqueles olhos percorriam as bandejas de bolo, os goles de café. Eram olhos famintos. Passei por ele, mas fiquei incomodada. Alguma coisa me dizia que deveria voltar. E, voltei. Perguntei:

-Menino, qual o seu nome?

-Pelé. Igual ao jogador.

-Você está com fome, Pelé?

Ele apenas abanou a cabeça. Pedi para a dona da barraquinha um pedaço de bolo de cenoura e um copo de pingado. Pelé comeu como se fosse sua última refeição.

-Hei! Calma! Vai lhe dar dor de estomago. Onde você mora?

-Ali, naquela esquina.

-Naquela casa?

-Não, na esquina mesmo.

-E seus pais?

-Eu não me lembro.

-Mas, você mora com quem?

-Tia! Preciso ir. Obrigado pelo café!

E ele sumiu. O menino tinha uma boa educação e eu estranhei o fato dele estar na rua.

No outro dia olhei para a barraquinha e nem sinal de Pelé. Olhei para a esquina que ele havia mostrado, mas, nenhum vestígio. Perguntei para as pessoas se o tinham visto e ninguém sabia de nada. Pensei nele por um bom tempo. Não o vi mais. Cheguei até pensar que o Pelé existia apenas em meus devaneios.

Passaram-se dois anos quando me deparei com ele novamente. Estava arrumado, bem vestido. O reconheci pelos olhos.

-Pelé, quanto tempo, menino!

-Oi, moça. Naquele dia esqueci de perguntar o seu nome.

-É Maria. E aí, o que aconteceu? Procurei você vários dias, mas não encontrei.

-Sabe, Maria, eu sou de uma família rica. Minha mãe acha que todas as pessoas têm maldade em seu coração, que querem apenas se aproveitar dos nossos bens materiais. Naquele dia eu queria provar para ela que ainda existem pessoas boas nesse mundo. E você me ajudou a mostrar isso a ela. Muito obrigado!

Ele apertou minha mão em agradecimento e foi embora, novamente. Fiquei ali, devaneando, lembrando daqueles olhos. Eu havia me enganado. Não eram olhos tristes. Eram olhos sábios.

 
 

fale com a autora