MANÍACO POR MANIAS
Jorge Costa Filho
 
 

Lupércio é um sujeito maníaco por manias. Exatamente: O cara tem mania de colecionar manias. Elas vão das mais simples e corriqueiras (como coçar a palma da mão quando está na iminência de receber algum trocado ou xingar toda a ascendência do árbitro que marca um pênalti duvidoso contra seu clube de coração) até as mais inusitadas e despropositais. Por exemplo: O Lupércio quando viaja de ônibus, só toma acento na fileira de poltronas da esquerda, ou seja, o lado do motorista, porque segundo ele, é o que o piloto tenta resguardar em caso de acidente. E só serve lugar no canto da janela, porque quem fica na lateral do corredor é assaltado primeiro, enquanto quem está sentado à janela tem mais chance de sobrevivência, se acaso um sinistro consumir o veículo. E não há argumento que o convença a sentar-se caso não haja lugares disponíveis na ala esquerda próximo à janela. Ele perfaz todo o itinerário de pé, ainda que bancos e mais bancos estejam desocupados do lado direito.

Cavucar o nariz com o dedo mindinho é outra mania peculiar do nosso amigo. É pra promover um "pente fino" no salão, disse ele, quando sua mulher o repreendeu à mesa do jantar.

Mas, o Lupércio também possui a mania de renovar, de quando em quando, seu inesgotável repertório de manias. Uma das mais recentes é a de conversar com o espelho. São intermináveis monólogos ou então, diálogos inimagináveis com personagens os mais variados, mitos da antiguidade, vultos da história moderna, artistas contemporâneos ou até mesmo, anônimos incautos do reles cotidiano. Outro dia, ele estava trancado no banheiro há mais de hora, quando seu filho bateu à porta:

- Pai, com quem o senhor está falando?

- Com ninguém, ora essa!

- O senhor vai demorar muito?

- Já estou saindo!

Passados alguns minutos, estranhando o repentino silêncio por parte do garoto, resolveu quebrar o gelo:

- Filho, papai já está saindo, valeu?

- Não precisa mais, pai. Eu já fiz nas calças.

Recentemente, Lupércio adquiriu o hábito de andar nu dentro de casa e ainda aconselhou toda família a fazer o mesmo. Mas, essa mania foi logo abolida, em protesto contra os assovios dos marmanjos da vizinhança, quando a patroa resolveu aderir ao naturismo aconselhado por ele e foi realçar o bronzeado, tomando banho de sol na varanda, vestida como nasceu.

Mas, no fundo, o Lupércio é um cara legal, apesar de suas manias que, afinal de contas, são inocentes, inofensivas e inodoras, salvo algumas de ordem escatológica, como aquela de pôr a mão em forma de concha sobre a divisória do "sentador", no instante de soltar um (sonoro ou não) pum, e logo em seguida, levar a mesma mão à frente do nariz, para aspirar o aroma dos produtos gasosos do próprio interior.

A Ediléia não se incomoda com o maníaco que tem dentro de casa, aliás, ela já adquiriu a mania de não esquentar a cabeça com nada. Só há uma "mania" do Lupércio que irrita, e muito, a nossa brava escudeira do lar: É a mania que ele tem de afirmar que não tem manias.

 
 

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