O TEMPO
Jorge Costa Filho
 
 

Em meio ao turbilhão caótico da metrópole que ruge e regurgita os fatos indigentes do cotidiano, onde tudo é urgente e volátil, eu pairo por sobre as horas que param na retina da civilização ruminante que muge ávida por mais e mais das mesmas velhas novidades que surgem metralhadas entre relinchos de notas repetidas que se apresentam como canção nova, entupindo os ouvidos de quem não quer mais ouvir.

Eu pairo por sobre as horas que param para ver a banda que passa descompassando a avenida, em frente ao paço central, deixando em seu rastro aquela histórica sensação de que tudo já foi visto.

Das matas latitudinais às longitudes do mar, eu rio de tudo e de todos, enquanto as figurinhas carimbadas recebem novos nomes e permutam indumentária pra compor novo (?) cenário, nos bastidores do texto reescrito pelas mãos reeditadoras do que atende por destino.

Hei de responder pra quem não ousa inquirir acerca da minha identidade: Eu sou o número da ampulheta, a areia do relógio, o ponteiro do calendário; Eu me situo entre as horas paradas, os dias que bailam, os anos que escorrem, a eternidade que chora. Eu sou a gênese do pensamento, ômega da emoção; Estou na palma da contramão, na sombra que projeta a imagem. Eu sou a ausência de direção de todos os sentidos, o espaço entre todas as relações, a perenidade do instante, o invólucro do jamais;

Eu estou em tudo
e sou o tudo além de tudo,
além do nada que gera o nada versus nada.

Eu sou o âmago do vento,
flor do desalento...
Eu... eu sou o tempo.

 
 

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