PRESEPADA NO NATAL
Fabias
 
 

O fim de ano é sempre emocionante e vem carregado de planos, sonhos, expectativas, alegrias, tristezas, choro e riso. Mas aquele ano era ainda mais especial.

Ela vinha se correspondendo com um rapaz a quase um ano, eram horas e horas de interurbano, cartas quilométricas, fotografias reais ou virtuais que enchiam o peito de esperança e calor e a recíproca era verdadeira, porque ele vinha passar o Natal - data da família - para que finalmente se conhecessem e fossem juntos para a terra dele. Eram muito planos e conversas intermináveis, eles falavam e riam ao telefone feito dois adolescentes, encantados com a voz um do outro pareciam dançar numa hipnose que não tinha começo nem fim. Os e-mails então eram incontáveis, era um de manhã para saber como foi a noite, um a noite para saber como foi o dia e um no meio pra dar detalhes sobre todas as refeições.

- Era bom mesmo que ele viesse logo e acabasse com esse devaneio, dizia a mãe já calejada, esperta e francamente um pouco enjoada com tanto dengo.

Ele chegava no aeroporto as onze da manhã e ela mal pregou os olhos, acordou a noite toda para ir ao banheiro, porque era assim mesmo, bastava um nervosinho, uma coisinha fora da rotina que o intestino logo se desarranjava. Mas não tinha problema, a ânsia era tanta que nem as olheiras atrapalhavam. Colocou aquele vestidinho rodado que marcava bem a cintura, passou perfume, batom, se meteu no salto alto e foi pro aeroporto buscar o seu amor.

E nada dele chegar, era mais de meio dia e era gente adoidado andando por aquele salão. O portão de desembarque enchia e esvaziava e nada, nunca era ele quem saía empurrando o carrinho trazendo um presente nas mãos pronto para abraçá-la. Mais um pouco e o salto começava a incomodar, o batom deixava um gosto ruim, de fruta, na boca e o vestido parecia ter diminuir e deixar tudo de fora, tamanho era o incômodo de ver as pessoas entrando e saindo e ela nada.

Começou a imaginar que o avião tinha caído e já podia ver a cena dos destroços, imaginou também que ele se arrependera na última hora e que provavelmente encontraria uma mensagem curta, de adeus, na sua caixa de entrada no momento que pusesse os pés em casa, pensava também no momento do encontro um beijo apaixonado e mais um pouco estariam um nos braços do outro. Nada. Podia imaginar tudo de bom ou tudo de ruim e nada acontecia do mesmo jeito.

- Será que é só comigo que acontecem estas coisas? - pensava ela em voz alta, já andando de um lado para outro descontroladamente.

Ela já estava a ponto de anunciar no sistema de comunicação interna, de ir perguntar na Polícia Federal se alguém estava lá preso sem poder entrar no país, de pegar o carro e entrar com ele dentro daquele bendito aeroporto que era o único empecilho no alcance da felicidade.

- Será que estou mesmo no lugar certo? - e foi perguntar no balcão de informações, alguma informação sobre o vôo, pela milésima vez. A moça na recepção já olhava com pena enquanto balançava a cabeça e a via se afastar.

Já estava fazendo promessa de não comer chocolate, tomar café, beber vinho tinto, tudo junto por um ano quando ele sai lá de dentro, todo de couro negro, especial atenção para o colete que parecia saído de um filme de faroeste, no maior mau humor dizendo que não tinha a maior paciência para passar em alfândega, assim seco, sem nem um beijinho, só um sorrizinho amarelo que ela logo culpou ao cansaço. As fotos ela imaginou que fossem todas bem antigas, pois ele só se parecia com o sujeito que aparecia nelas, e ele devia estar cansado mesmo pois estava suando em bicas.

Os dias se passaram e as pessoas notavam que ela não parecia aquela mesma moça tão encantada, ele falava em casamento mas não trouxe nem um presentinho de Natal, não pagou nem sequer um sorvete naquele calor que é Dezembro e andava no maior mau humor enquanto ela tentava mostrar tudo que tinha pra ver em São Paulo.

A gota d´água foi quando uma menininha no shopping apontou para ele e disse pra mãe:

- Vamos logo mamãe, eu tenho medo do Papai Noel.

 
 

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