ÚLTIMA GUERRA
Alexandre Ferreira
 
 

Os tambores de ossos ressoavam ao longe, mas o vento que soprava forte na direção contrária a que nós caminhávamos trazia os sons estridentes de suas maquinações diabólicas e o nauseante cheiro forte de enxofre que me invadia as narinas enchia meus pulmões, sangue e cérebro de nojo e raiva.

Um prenuncio da guerra, a última das guerras. As cinzas que suas crepitantes fogueiras espalhavam pelo ar me turvavam a vista dificultando enxergar a linha de frente das hostes negras que se aprontavam para o combate no horizonte cor de fogo. Lanças riscavam o céu partido ao meio, eles se movimentavam com pesar e sofreguidão, mas seu algoz os fazia manter o corpo em riste para a luta. Um exército morto e um tanto quanto cambaleante se alinhava torto à base de açoites e chicotadas, enquanto do nosso lado um general altivo e cheio de experiência nos alertava das armadilhas que um grupo aparentemente derrotado pode esconder.

O sol pintava leve nossas peles ouro e aquecia brando nossas brancas vestes. Estava decidido, combinado, tratados de guerra, o combate seria corpo a corpo, infantaria contra infantaria, sem arqueiros a atirarem suas flechas, nem máquinas de combate que assassinam de longe.

Vinham devagar, mas o tempo corria lépido e sua presença aterradora já assustava os menos experientes. Até que se ouviu a ordem: "Quando aqueles malditos saírem de seu lamaçal flamejante ousando profanar nossas verdes gramas com seus pés imundos e cheios de feridas, nós amantes da luz os esmagaremos de uma vez por todas e precipitaremos no mais fundo dos abismos a reles sobra de seus despojos".

Eu vi algumas asas brancas tremerem de medo diante do eminente inicio da batalha; vi também a calma contagiante do nosso general, que ante aos praguejos desferidos por nossos adversários apenas fez, com a mão direita, o sinal da cruz sobre si mesmo e sobre nós enquanto cheio de confiança puxava da bainha dourada uma espada brilhante e grandiosa que de pronto foi apontada ao céu de duas cores; Ouvidos atentos ao silêncio que se fez quando o verde orvalhado de nossos campos começaram a arder no fogo amarelo, o sinal havia sido dado, atacar era inevitável, espada em punho, as asas se agitaram, e como um raio luminoso nosso general rasgou a linha de frente inimiga nos encorajando a avançar acima das primeiras filas e protege-lo do mal. Os gritos se multiplicavam, o sangue dos ímpios nos sujavam asas, roupas e espadas, muito se perderia naquela guerra, mas a fortuna honra os justos e puros de coração. Lutaremos sem cessar até que pérfidas serpentes sejam aniquiladas; quem dera esses pobres diabos nunca tivessem almejado, em sua soberba, sentar acima das estrelas.

 
 

fale com o autor