MARINA
Angela Viana
 
 

Ouviu quando a mãe falava ao telefone e embora tivesse apenas seis anos, compreendeu do que se tratava a conversa e assim que ela desligou, a menina foi logo perguntando:

- Hoje eu vou ver o meu papai?

- Eu já te disse que é feio ficar escutando a conversa dos adultos escondido...

Percebeu que a mãe estava mal-humorada, mas insistiu:

- Por que o meu papai não me conhece?

- Porque ele nunca ligou prá você. - respondeu a mãe, secamente.

- Mas agora ele ligou e quer me ver, não é mesmo?

A mãe não respondeu, foi para perto da janela e acendeu um cigarro:

- Você tinha prometido que não ia mais fumar, mamãe...

- Ele vai vir aqui hoje à noite. Quero que você se comporte, Marina.

Sentiu o coração bater acelerado, finalmente ia conhecer o pai e assim que pudesse o levaria até a escola para que os amiguinhos soubessem que ela tinha um pai:

- Mamãe, como ele é?

- Logo você vai ver.

- Eu pareço com ele?

A mãe a olhou atentamente, como se jamais a tivesse visto antes e após alguns segundos de hesitação, disse:

- Parece um pouco.

- Um pouco como?

- Ora, Marina! Não me amole mais. Vá brincar!

A menina bem que tentou, mas não conseguiu brincar, ficou imaginando como seria o pai. Será que ele iria gostar dela? Olhou-se no espelho e se lembrou do que a avó sempre dizia quando a via:

- Essa menina está muito magrinha!

Será que ele também ia achá-la magrinha? E ele? Era magro ou gordo? Preferia que ele fosse como o tio. Adorava o tio, mas... E se ele fosse como o pai da Bruninha, que vivia de cara feia e sempre brigava com a mulher e os filhos por qualquer motivo? Não... Seu pai com certeza era uma boa pessoa. Se não fosse, ela lhe diria que não queria mais ser sua filha e tudo voltaria a ser como era antes.

Passou o resto do dia ansiosa, não quis almoçar e só comeu uma maçã porque a mãe, zangada, disse-lhe que se não comesse, não iria ver o pai. Quis tomar banho bem antes da hora de costume, achando que assim o tempo passaria mais rápido, mas a mãe não deixou:

- Não adianta ficar nessa expectativa toda. Ele só vem às oito.

Naquele dia aprendeu a ver as horas, pois não saiu de perto do relógio até a hora do banho. Quis lavar e escovar os cabelos e escolheu com cuidado o vestido que iria usar, exigiu também que a mãe a deixasse pôr a meia-calça nova e os sapatos de verniz que só tinha usado uma vez:

- Você está linda! - exclamou a mãe, sorrindo.

- Não. Ainda faltam os brincos!

Depois de pronta, sentou-se no sofá e ficou quieta, como nunca tinha ficado antes, a mãe foi providenciar o jantar e de vez em quando lhe perguntava:

- Você está bem?

Ela balançava a cabeça afirmativamente e a mãe, preocupada com tanto silêncio, começou a ficar com medo de que o pai não aparecesse. Mas às oito em ponto a campainha tocou e a menina foi atender. O pai a abraçou fortemente, ela sentiu um nó na garganta:

- Você é muito bonita. - disse ele, com a voz embargada.

- Obrigada. - respondeu ela, timidamente.

E assim, Marina passou a receber a visita do pai nos finais de semana. Eles se davam muito bem e às vezes a mãe ficava enciumada, se sentindo excluída pela filha. A menina adorava o pai, a única coisa que não gostava nenhum pouco era quando ele ia embora, ficava chorando horas e horas e só parava quando a mãe se impacientava e lhe dizia que se continuasse com aquela mãnha, ela não iria passear com o pai no próximo fim de semana.

Tudo ia bem até que a mãe recebeu uma proposta de trabalho em outra cidade e se mudou com a filha. Marina passou a ver o pai apenas nos feriados, foi difícil para se acostumar no começo, mas percebeu que tinha que se conformar. Passou a conviver com as expectativas das vésperas de feriado, até que o pai se casou e a menina passou a vê-lo somente nas férias.

Marina sentia muitas saudades do pai, sentia também muita falta da ansiedade e expectativa que tinha nas vésperas dos feriados. Agora teria que esperar as férias para vê-lo e então sentir tudo outra vez...