Á MEUS COMPANHEIROS ARTISTAS
Chico Franco
 
 

Não me agüento mais.

Fico aqui sentado na frente do micro, tentando armar um texto para nosso próximo encontro, e no meio do tempo, vou lendo você devagarinho, e percebendo todo o empenho e o carinho, de mãe nutrindo o filho, para que ele, o rebento, tua escrita, cresça forte e decidida, suba no barco da vida, e cumpra seu papel na eternidade.

É a terceira vez que acontece. Tenho a terceira escrita quase pronta e aí, eu começo te ler e literalmente desabo e travo, e fico só na saudade.

Quando não fico puto da vida junto com você, me envolvo todo na fumaça dos teus cigarros, nas músicas, nas janelas e nas gotas, nos lençóis, nos livros, na poesia das idades, nos movimentos e cheiros, fisionomias, sonhos e mesmices, nas vivências cuidadosamente adornadas com versos e prosas, doces ou dolorosas, nos sentimentos que emanam todos, dos teus dedos, cara, ao tocar este bendito teclado alfa-numérico.

Expectativas ? Um universo a cada frase tua.

Que capricho da natureza !

Mentes e Sementes.

Fecundas e mordentes.

Sem sabe-lo, ou nem tanto, você acaba dando sentido à minha busca.

Não sei o que faço, mas não faço por menos.

Acordo em tempo e termino, pelo menos este tema. Segura :

 

Aos Escritores e Escritoras

Cara, não consigo parar de te ler.

Segunda sim e outra não, espero mais por você do que por mim mesmo.

O que é que está acontecendo comigo, meu ?

Tem gente que precisa de cerveja.

Tem gente que precisa bem mais.

Expectativa dos sentidos ?

Fuga da realidade ?

Ou a busca dela, nesta bosta de mundo ?

Não é à toa que tá tudo tão ruim, e tem tanto nêgo fugindo pelas tangentes oferecidas pelas drogas.

Eu, inclusive.

Meu contra-baixo é uma droga, que preciso dele às 3 da manhã para me centrar e conseguir pegar no sono , para depois, ter que acordar as 5 e meia e ir trabalhar. E ainda dar graças a deus por ter um emprego.

Meu conhaque é uma droga, pois além de ser nacional, tocar sem ele na noite, torna-se um sacrifício maçante e sem graça, mesmo porque, fumar não fumo mais.

Descobri uma nova droga. Você.

Você sabia que era uma droga ?

Saiba, pois, agora.

Quem é você?

Você é uma droga, socialmente aceita, que me transporta para uma realidade paralela, e me faz sentir bem.

Ler você, me faz esquecer de mim mesmo; me faz flutuar nas tuas idéias e nas tuas letras.

Como é bom te ter a meu lado, toda vez que estou aborrecido ou magoado.

Você me dá força para seguir rompendo adiante, o pantanal nebuloso da existência, nem que seja para me projetar para dentro da boca de um crocodilo.

Você me dá, de presente, toda vez que te leio, a certeza de não estar sozinho.

Não canso de te agradecer, e agradecer a Deus, pela tua inspiração.

Aconteça o que acontecer, por favor, não pare.

Obrigado.

 

Fala agora, o Analista pentelho :

Partindo-se do princípio de que droga é droga, independentemente de se socialmente aceitável ou não :

Tem um lado de mim, que ficou muito satisfeito com o que escrevi. Bonito, duro e cru. Como a própria realidade.

Tem um outro lado, que está coçando a cabeça, achando que há uma distorção e uma maldade embutida na idealização das drogas como arte, ou arte como drogas.

Aquele, está feliz, pois foi muito espontâneo depois de ler a última safra de escritos.

Este, está se olhando com desconfiança, tentando enxergar alguma coisa mais feia por trás do que foi escrito. Talvez um potencial drogado convencional.

Aquele, vibra por estar conseguindo ser honesto e autêntico o suficiente para expor o que sente e o que vê, aos quatro tempos do mundo.

Este, desconfia que aquele está indo longe demais, e teme incompreensões e narizes tortos.

Aquele, pede que este o liberte nas picuinhas da maldita formação acomodada igrejista-neo-capitalista-ocidental-materialista-conformista-fatalista-consumista.

Este, não consegue deixar aquele em paz, pois a convivência de longos anos tornou tudo muito difuso e comum aos dois, a ponto de não se saber mais quem é este ou aquele.

Aquele, se recorda de já ter escrito a esse respeito, quando percebeu que havia mais de um dentro dele.

Este, está, no fundo, muito triste, pois também se recorda do que escreveram, mas naquela oportunidade, houve um entendimento de que cada um deveria fazer a sua parte. Agora está sendo diferente.

Aquele, permanece em silêncio, pois percebe que este precisa de um tempo para tentar se posicionar melhor dentro de si mesmo.

Este, está cansado de viver a dupla, e de se desgastar para manter a sua óptica de tudo que nos diz respeito.

Por seu lado, aquele gostaria de transformar este em alguém mais seguro de si, e de tudo o que se entende por viver a vida.

Este, continua triste e confuso, aceitando que não sabe como tratar as coisas, se lhe fosse restituído o tal do livre-arbítrio. Tem medo de pensar em tudo praticamente novo.

Aquele, sem muito entusiasmo, aguarda este se posicionar, sabendo que em muitas outras oportunidades, este já tentou e não conseguiu se libertar.

Agora, é este que fica em silêncio, buscando alguma maneira de não desapontar, de novo, aquele.

... e a busca continua, na próxima segunda -feira da nossa existência.