DESVENTURA
Luciana Pareja Norbiato
 
 

Em nova peripécia do coração, mais uma desventura minha, encontrei quem não devia. Entreguei meu coração, minha alegria, o dourado do meu calor que a tudo inebria. Mas qual! Nesta estrada, na jornada dura e fria, mais uma trombada de frente, mais uma curva esquiva como a pessoa que disse me amar cinco dias antes. O peito que aqui escreve quase não respira, dilacerado que está em seu pulsar sozinho em meio a tanta efusiva frivolidade. Eu sei o tanto que poderia ter te amado, eu sei o quão suave teria sido o caminho se o partilhássemos juntos, unidos em nossas vidas não como ser único, utopia rançosa e mesquinha, mas como dois seres que escolheram dar as mãos e enfrentar com valentia a vida.

Valente você não é, isso eu não sabia. Se soubesse, teria sido cautelosa, mas nunca fria, que isso não posso, não sei ser, fogo fátuo, carne viva que sou, que sempre serei, a despeito de ser rejeitada dia a dia por tanta gente fechada em seu mundo sem fantasia e beleza. Eu teria te amado da mesma forma, mas com a ressalva de saber que você não conseguiria suportar um amor maior do que se pode entender, que se pode apenas aceitar.

Retribuição é questão simples: não é ser igual a mim, dizer o mesmo que eu e fazer tudo o que eu faço em nome do que sinto. É respeitar os próprios limites, é amar como e tanto se pode, sem contudo soltar sua mão da minha, fazendo-me sentir que você vai estar lá no outro dia, que me aceita escancarada que sou e você sendo tudo o que é sem qualquer hipocrisia.

Vamos transitar para um estado de morna irmandade, quando o que eu queria e você _embora finja indiferença ou incapacidade_ também queria (ainda quer) eram nossos corpos em chamas na entrega furiosa do amor, do gozo, e nossos risos ecoando em harmonia.

Nada disso será. Por uma decisão arbitrária e temerosa de sua parte, nada disso será.

O que se faz quando o chão desaparece e tudo em que se acredita vira vapor a sair da testa quente pela febre do abandono? É chorar o choro doído do desconsolo para limpar a vista e tirar do corpo alquebrado os vestígios do ser que não se permite ser amado.

É lavar a alma, é curar as chagas, é arrumar as malas e continuar a viagem, até que eu encontre alguém que tenha a coragem de enfrentar a si mesmo e olhar para o próprio negrume e se ver sem disfarce em nome de aceitar alguém que não seja igual (eu), mas que tenha como igual objetivo cultivar um amor vivo, que, dure o tempo que durar, tem o poder de abrir caminhos e iluminar destinos.

Aqui dou o primeiro passo a caminho do desconhecido.

 
 
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