A PAIXÃO É VERMELHA
Leila de Barros
 
 

"Meu amor tem um beijo guardado pra mim
E a cor do batom é vermelho carmim
Meu amor tem dez dedos cravados em mim
Que me rasga me arranha e me deixa assim
...
A cor do pecado é rouge carmim"
- Alceu Valença -

A paixão é erótica. Tem cor de cereja, rubra e incandescente e costuma iluminar e abrasar bocas, feito pimenta malagueta.

Quando sua cor é a do morango selvagem, ela pode inflamar e seduzir os egocêntricos. Como no caso de alguns políticos que fartam seus egos até derramarem vinho tinto em nossas toalhas de linho branco, discretamente, é claro.

Se ela assume essa tonalidade, pode evoluir até o rubro, ou tornar-se verde como as notas do dólar.

Nesses casos, a paixão é dantesca e flamejante como uma tira de seda escarlate, uma faísca de Marte. Pode durar o tempo da eternidade, diluindo-se entre ideologias, promessas e dossiês. Ou pode durar um nanosegundo. Então ela assume aquele gosto de mirra.

Mas, há paixões mais apetitosas.

A paixão voraz bebe água de rosas e corta com os incisivos as pétalas vermelhas e as alças de seda carmim.

Usa pérolas claras, tem dorsos fortes, seios fartos, pernas de atleta e corre como os lobos. É um cruzamento perigoso, semáforo cor de romã.

Pode ser remédio e pode acordar elementos adormecidos e já esmaecidos. Ela começa com passos lentos e vai evoluindo até o ponto de fazer uma porta-bandeira dançar sob o asfalto ardente.

A paixão pode encantar e seduzir, mas pode mirrar sob um sol de 40 graus ou se tocar a neve por muito tempo.

Ela precisa de gotas de chuva, pétalas de rosa vermelha, morangos fartos e um toque de colorau no tempero. Pose ser afrodisíaca ou ter gosto de chuchu. Depende da qualidade do beijo.

Ela pinta-se com os frutos do urucum, tatua-se com tribais cor de vinho e é do signo do fogo.

Mas há paixões mais aromáticas e deleitosas e há tantas outras mais brandas, com a cor das flores do muçambê.

Deve ser servida em taças cristalinas, desde que a calda seja vermelha e abundante.

Só se pode brindar a ela com um espumante rosado, sussurrando em francês.

O dorso humano abriga um rubi que pulsa apaixonado e infindavelmente. Ele a tudo alcança, guardando uma sabedoria fina e calma. É a caixa vermelha.

A paixão é volátil, é um fardo e um enigma, aperta como o corselet vermelho do Molin Rouge, mas é impossível não se olhar, ou usar.

Tem o sabor e a cor do oxicoco e deve ser consumida com moderação, ou não.