MOTEL
Raymundo Silveira
 
 

Marido e mulher há mais de cinco anos. Casamento em crise. Encontravam-se naquela fase de quase desespero, na ânsia de salvar a relação. Pensaram em tudo... Criatividade sobrando. Ambos escritores de romances e contos eróticos. A sugestão partiu dela. Quem sabe aquela seria a solução. Pelo menos a última tentativa. Conhecia casais amigos que se tinham reconciliado depois de experiências semelhantes. Às quatro horas de um sábado à tarde saíram sozinhos. Mas separados. Ela no Honda. Ele no Vectra. A intenção era se reencontrarem depois de dez da noite. E experimentarem algo nunca imaginado. Cada um criaria a sua própria fantasia. Mas só depois que se afastassem. Apenas dois detalhes estavam previamente combinados: horário e local exato do encontro. Ele chegaria primeiro. Daí por diante tudo ficava por conta das fantasias.

Ele deu partida no automóvel sem mesmo saber que destino tomar. Depois de rodar alguns quilômetros decidiu visitar um casal amigo. Conversaram o que conversam dois homens e uma mulher jovens numa tarde de sábado: banalidades. Sequer os temas prediletos podiam ser abordados. Os deles futebol e política. Os dela, novela e casa bonita.

A outra saiu já sabendo exatamente para onde ir. Seguiu também para a residência de uma amiga. Era divorciada. O marido não a conhecia. Saíram juntas poucos minutos depois. E foram fazer o que fazem duas mulheres jovens, com bastante dinheiro, num sábado à tarde. Não precisava dizer que foram compras. Como já foi dito, fica assim mesmo. Antes de irem para o Center, passaram num sex shop. A companheira sabia da intenção da outra e ajudou a escolher. Era mais experiente.

O marido e o casal amigo ficaram a bebericar. Dentro de algum tempo, a conversa mudou de rumo. Em vez de banalidades, literatura. Em vez de brasileira, americana. Em vez de Poe, Henry Miller. Em vez de “Trópico de Câncer”, “Nexus”, “Plexus” e “Sexus”. Todos concordaram que, depois de Miller, o mundo não seria mais o mesmo. E as cremalheiras do tema se encaixaram como o côncavo no convexo. Durante todo o restante do tempo. Lubrificadas por pequenos goles de Logan.

O álcool é uma espécie de soro espontâneo da verdade. Depois da terceira dose confessou, primeiro ao amigo e depois à esposa deste, o que planejava para aquela noite. Melhor dizendo, o que não planejava. Pois, simplesmente, nada lhe ocorrera ainda. Os dois, a princípio, riram muito. Logo depois marido e mulher se tornaram pensativos, enquanto se entreolhavam de esguelha. “Se nos deres dez ou quinze minutos a sós, talvez teremos uma solução para o teu impasse”.

As duas amigas voltaram exaustas. Mergulharam na piscina enquanto conversavam. O tema não diferia muito da outra conversa que se passava a quilômetros dali. Amadeus, o mordomo, se empenhava em servir bebidas e canapés. Comentava-se, à boca pequena, que havia um caso entre ele e a patroa.

Às dez em ponto o esposo chegou ao Motel escolhido para o encontro e informou ao porteiro que esperava a esposa. Deixou um envelope lacrado contendo as seguintes instruções: Não nos veremos. Tudo se passará às escuras. Nada de perguntas. Nada de palavras. Seremos como dois estranhos. Só que estaremos cegos e surdo-mudos. O gerente indicará o quarto em que me encontro. Entre sem bater.

A esposa entrou meia hora depois e chaveou a porta. O quarto imerso em trevas. Demorou um pouco a adaptar a visão ao escuro. Do marido, só o vulto. Mal ela entrou, ele foi lhe tirando a roupa com uma violência que ela desconhecia. Fez o mesmo com ele e se pôs de costas, como costumava fazer. Algo morno e roliço se insinuou entre as nádegas e parou. Duas surpresas a aguardavam. Ele não costumava fazer assim. Ia logo às vias de fato. “Está tentando ser paciente e criativo”, pensou. “Melhor assim. Talvez me excite mais e melhor”. Havia outra estranheza. O volume era absurdamente grande. “Deve estar usando um pênis artificial. Nem precisava... Trago na minha bolsa”.

Como parecia não haver espaço para uma boa acomodação, ela tomou as duas nádegas com as mãos e as afastou. O pênis penetrou um pouco A impressão era a de que o tamanho da glande fosse o mesmo do de uma bola de tênis. Aquele volume descomunal, jamais experimentado antes, acariciava os bordos do ânus. Do meato brotavam longos filamentos de muco que tornavam aquelas carícias mais macias, deslizantes, deliciosas. Parecia um lubrificante natural. Ambos se tremiam de tesão.

Ele forcejou um pouco. Não progrediu um centímetro. Relaxou o mais que pôde e empinou um pouco o bumbum. Agora sentia que a extremidade afastava as margens do esfíncter e sentiu dores. Tentou recuar. Ele não permitiu. Permaneceram, nessa posição durante cinco minutos. Somente então a glande ficou rente ao orifício. Não penetrou ainda. Ela pôs as mãos pra trás e apalpou os testículos. E então teve certeza: Não era o marido. Tentou escapar. Ele a segurou firmemente pelas ancas, imobilizando-a. Tracionou-as. E com um só impulso, fez a cabeça atravessar o esfíncter. Um grito de dor. Já era tarde para recuar.

Debruçou-se aos pés da cama como se fosse apanhar um objeto caído ao chão. Este movimento sugou todo o pênis para dentro. Como se tivesse se formado um vigoroso vácuo. Então se entregou completamente. As estocadas tiveram início. A princípio lentas e suaves; quase paradas. Depois com a violência dos desesperados de desejo. Ela não suportou e pediu mais... Rouca, trêmula... Também desesperada. Nesse instante sentiu um enorme volume de líquido morno e espesso esguichando no âmago das suas entranhas. O marido acendeu as luzes. Ele também gozava. Mas se encontrava a cerca de cinco metros de distância. As luzes voltaram a se apagar. O estranho desapareceu.