SEM PALAVRAS
Bárbara Melo
 
 

Às vezes teimo em acordar sem ar, assustada.

Não entendo o porquê de tanta palpitação.

Ofegante, sinto a noite sair de mim, ansiosa por escurecer tudo ao redor.

Dentro, só ouço um tambor prestes a explodir.

Tenho a boca sedenta, não sei do quê. As pupilas dilatadas, não sei pra quê.

Úmida, minha mão congela com branco que, agora, cala minha mente.

Quase sinto o sabor morrer. Na mordida, minha língua nem o sangue reconhece.

Então, em meio a dor da paralisia, começo a me lembrar: que muitas palavras não vêm por vergonha de sair pela mente torta, que outras caladas não nascem pela teimosia da boca morta.

Recordo, aos poucos, que, dentro de mim, tudo é palavra.

De novo com elas sonhei a se esvaírem por dentre os meus poros.

Em meio a estas noites ceifadas, a palpitação, a escuridão, o branco, tudo, se resume ao temor que tenho de perdê-las.

Se acordo sedenta é por elas, se minhas pupilas se dilatam é pra elas.

Não há castigo mais cruel que a ameaça de não se ver nascer a palavra amada. Não há vazio mais abismal que não se poder ver a palavra sendo escrita dentro de si.

A possibilidade das palavras fugirem, pra nunca mais coçarem meus dedos, pra nunca mais rodopiarem meus desejos, me faz tremer.

O que me aconteceria?

Não sei.

Estaria, talvez, fadada a reconhecer a conquista do nada, mais, de uma vida pálida, vazia, doente.

Compreenderia que o que me faz faltar a voz, em meio à tantas madrugadas, não seria só um pesadelo, mas a materialização do que me faz despertar abruptamente, encharcada de medo: A MORTE DOS MEUS VÔOS PARA DENTRO DO MEU INFINITO.