O MILAGRE DE NATAL
Cristina Del Nero
 
 

Toda a família estava reunida para o natal. Filhas e genros rodeavam a matriarca, vestida de Papai Noel. Os netos se escondiam atrás dos pais, com medo daquela figura estranha, torta na cadeira. A velha senhora havia sofrido um derrame e tinha um dos lados do corpo meio paralisado. A idéia de vestí-la de Papai Noel tinha sido das filhas. Talvez fosse seu último natal. Mesmo sem falar, a velha senhora olhava para todos com um ar incrédulo. Ninguém se dera conta da crueldade daquele ato. Um dos genros, tenta animar a festa:

– Vem filhinha, fale oi pro Papai Noel.

– Não quero ... ele é o homem do saco !

– Não é não! Aquele saco está cheio de presentes!

– Não querooooooooo, berra a criança.

A velha senhora pensa com seus botões: “Tanto trabalho pra casar essa filharada e agora sou obrigada a ouvir da neta que eu sou o homem do saco”. Uma das filhas, talvez se sentindo culpada, pergunta para a mãe, sabendo que não vai ouvir nenhuma resposta:

– Mamãe, a senhora está com calor?

“Não”, pensa a mãe! “Está nevando lá fora”.

Chega a hora da ceia e todos se sentam à mesa. Menos a velha, que continua na cadeira com aquela roupa ridícula e a barba grudada em seu rosto úmido. Alguém grita:

– Pega a mamãe.

Um dos netos berra:

– Ah, eu sabia que era a vovó!!! Papai Noel não deve ser assim tão velhinho.

“Estava passando dos limites”, pensa a velha senhora. “Se tivesse condições deserdaria todos os filhos neste exato momento”.

O Papai Noel é carregado até a mesa. Com uma das mãos, ela se agarra à toalha e vai puxando-a até o peru cair da mesa. Correria. Todos se levantam para que as filhas arrumem a mesa. Neste instante, a porta se abre bruscamente. O enfeite de natal cai no chão. Todos olham naquela direção.

– Ho, Ho, Ho, grita um outro Papai Noel, pisando no enfeite de natal.

– Papai Noel - grita a netinha.

O pai fala:

– Fica quieta ... deve ser o homem do saco.

O Papai Noel se aproxima da mesa, arranca uma das coxas do peru e come. Em seguida, pega a velha senhora nos braços e sai pela porta dizendo:

– Feliz Natal seus desnaturados.

Ninguém se move.

Lá fora, Papai Noel arranca a sua barba e a da senhora e lhe dá um beijo na face. A velha senhora sorri. Como sonhara com aquele momento. Seu velho amante de tantos anos, entrando pela porta da frente e não pulando a janela, como sempre fazia. Ele pergunta carinhosamente:

– Passou muito calor com essa roupa?

– Isso não foi nada. Pior foi fingir paralisia durante 6 meses.

E lá se foram os dois felizes para sempre.