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       TABACARIA 
        (excerto) 
      Tu 
        que consolas, que não existes e por isso consolas, 
        Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva, 
        Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta, 
        Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida, 
        Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua, 
        Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais, 
        Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê 
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        Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire! 
        Meu coração é um balde despejado. 
        Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco 
        A mim mesmo e não encontro nada. 
        Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta. 
        Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam, 
        Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam, 
        Vejo os cães que também existem, 
        E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo, 
        E tudo isto é estrangeiro, como tudo. 
      
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