BRASIL, PAÍS DO FUTURO
Vera do Val
 
 

A Sarará não teve como recusar. Veio ministro, figurão, uma gente vestida de granfino, até um Big Boss lá dos Esteites veio também subindo o rio e enfrentado carapanã. E cada um com seu argumento.

- O Brasil tem que participar - dizia o americano.

- É um esforço para o bem de todos. – falava o outro, com sotaque francês.

- Vocês passarão para a Historia, - era o japonês sorridente.

- Além disso, é um patrimônio da humanidade. Está na hora de dividir. – engrolava o inglês encharcado de uísque.

Dona Joana matutava. Sabia que o seu puteiro era famoso, afinal muita gente importante passava por ali. Só não imaginava o quanto. Desde que aquilo existia era um tal de atracar barco e aparecer gente vestida de tudo. Lembrava dos mais antigos, de coronel a missionário, de cientista a explorador, até salvador da pátria. E agora essa! A casa cheia de bacana, uma gente esquisita, falando enrolado. Mas mudar para as estrelas? Aquilo era demais para sua cabeça.

Os homens insistiam. O programa espacial estava de vento em popa. Tinha astronauta girando para tudo que era lado, o céu empesteado de foguete indo e vindo. Nem olhar para a Lua sossegado se podia mais. Perigava, de repente, despencar uma titica qualquer na cabeça. Sim, porque essa gente de primeiro mundo estava lá se lixando para os que estavam aqui embaixo. Ainda mais se a titica caísse abaixo do Equador.

Era uma realização do G7, dos grandões e agora tinha chegado à hora do Brasil contribuir.

A cidade na Lua era um portento. Toda prateada, cheia dos confortos e elegâncias que rico é sempre metido a besta. Tinha de um tudo, desde uma fábrica da coca cola, contribuição dos americano, até os franceses que já tinham três padarias e os alemães uma salsicharia de dar gosto. Os japoneses montaram um mix de Sansung e Mitsubishi, a Inglaterra, para se exibir, levara uma destilaria escocesa e a Itália contava com meia dúzia de cantinas espalhadas. Sem esquecer que os canadenses já estavam abastecendo os açougues. Vaca brasileira nem pensar.

Mas não tinha puteiro!!

A gente sabe que homem é tudo igual, pode ser americano emproado ou jagunço do sertão pernambucano, na hora do vamos ver ficam pianinhos. Não havia adiantado muito aquele negócio ensaiado de realidade virtual, plastificada e com cheiro de desinfetante ou coisa parecida. Nada disso. Puteiro é puteiro, não se fala mais nisso.

Foi feita uma reunião nas Bahamas cheia de líderes, representantes dos moradores, psicólogos, especialistas. Tinha economista e político também que isso não pode faltar nem em reunião de condomínio, que se dirá em reunião em lugar paradisíaco. A discussão demorou dias. Os homens na Lua andavam meio macambúzios. Isso preocupava. A moral em baixa, nem o basebol ou o golfe estavam resolvendo.

- Queremos putaria - dizia o de bigodes e barrigudo, representante dos moradores. - E da boa, da melhor que há!

Pensaram em convidar a Holanda, com as famosas ruas de Amsterdã, mas o dono dos bigodes torceu o nariz.

- Muito raquíticas. Queremos putas com fogo nos olhos e requebro na bunda. Puta com sustância. Encorpada!

Pensa que pensa e se coça a cabeça. Por onde começar a putaria? O inglês, trançando as pernas, que inglês que se preze nunca está sóbrio levantou-se e dirigindo-se para o grande mapa enganchado na parede disse:

- Aqui! - E sapecou o dedo na Amazônia.

Todos os rostos se iluminaram com um sorriso alvar e inocente. Claro! Sem dúvida! Em que país tantas facilidades? Era chegar e levar. Afinal essa gente vive esperando o futuro e a nós aqui vivemos é no presente mesmo.

Imediatamente mandaram emissários para Brasília, muitos e muitos presentes que disso não podiam esquecer, sabiam como a coisa funcionava com a flor do cerrado. O Presidente ficou todo vaidoso, o ministério alvoroçado.

- Um convite para o G7! Nosso país construindo o Futuro – anunciou em rede nacional – A contribuição brasileira para o mundo!

- Mas não vai haver gritaria? – alertou um ministro recém chegado, ainda novato.

- Ora, ora, - o presidente cofiou a barba e deu um risinho. - Qualquer coisa a gente diz que não sabia. E está sobrando lá, porque não dividir um pouco? Além de tudo aquilo é a casa da mãe Joana.

Um ecologista de plantão ainda sugeriu:

- Podemos inventar umas exigências. Para cada puta levada eles têm que plantar mais uma. – e sorriu amarelo.

E despencaram todos na casa de Dona Joana Sarará. Gringo e tupiniquim, uma mixórdia. Ela ficou atarantada, mas deslumbrou mesmo, de cair o queixo, quando o Presidente chegou, barbudo e ciciante, falando da importância do acontecimento. Veio com uma comitiva de doutor de dar gosto. Tinha engravatado saindo pelo ladrão.

- Vamos lotear... Vamos lotear.... - dizia um assessor tão afoito que precisou levar uma cotovelada para se mancar.

- Isso é a segunda etapa – sussurrou-lhe ao ouvido um político local.

- Yes, yes – cambaleava o inglês batendo amigavelmente nas costas do político. Espalharam-se por ali verificando o terreno e já adiantando o inventário. Toc.. Toc... Era o japonês deslumbrado batendo com o nó dos dedos no tronco de uma gigantesca sumaúma. O americano avaliava uma imensa castanheira. O francês, que não dorme de touca, logo reconheceu o mogno antigo. O inglês, que continuava bêbado, mas esperto, o empurrou e disse:

- Sai daí. Arreda que eu vi primeiro.

- Legítimo, Doutor. - Era o político tupiniquim todo cheio de sorrisos para o filho da velha Albion.

E toma discurso, e deita falação. E oferece mais presente, machados facas e bugigangas similares, que isso desde o tempo dos missionários e dos índios nunca caiu de moda e ainda funciona maravilhosamente. Uns intelectuais metidos nos brios ainda pensaram em argumentar. O Presidente com uma penada lhes aumentou a verba e eles sem tugir nem mugir saíram de fininho.

Dona Joana não resistiu!

Botou todo mundo nos bofes para arrumar a bagagem. Foi um corre corre danado, até Vagalume, o cachorro de estimaçao, embarcou nessa.

Pois a coisa aconteceu assim. Primeiro as putas, depois as árvores, os passarinhos, os bichos.

E hoje o que nos resta é olhar atentamente para a Lua e ver as ancas da Caolha, rebolando, para construir o Brasil Grande.

 
 
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