OPERETA NOTURNA
Leila de Barros
 
 

Noite de inverno... Céu pipocado de estrelas e a lua em forma de curva feminina.
A brisa fria traz ao chão as pétalas rochas do Ipê, anunciando a primavera.
Mas, ainda o outono faz o vento assoviar e chicotear os telhados e as janelas dos apartamentos.
Noite imensa, longa como as pernas da bailarina...
Os gatos miam e os espelhos falam em sua linguagem reflexiva.
Sento-me com meus insights e ponho-me a tricotar longos pensamentos.
As luzes da cidade piscam e poucas pessoas perambulam pelas ruas envoltas na névoa outonal.
A cidade assumiu um ar londrino de repente.
Pela janela avisto as pequenas gêmeas brincando na sala de estar. Elas não sentem a extensão das noites sem calor.
Noite imensa, longa como a torre de uma catedral gótica...
O fogo da lareira crepita e o aroma de sândalo inunda o ar, me convidando a dançar a valsa das folhas douradas.
Nada como ouvir violinos nessas horas.
As horas passam lentamente e o relógio carrilhão parece me encantar ou me entorpecer.
Anseio pelas noites de verão e pelos primeiros raios de sol.
Leio alguns poemas de Drummond, a mente vagueia entre as visualizações e as estrofes tão calorosamente escritas.
As estrelas escapam entre as nuvens e se deixam cintilar para mim, como uma recompensa dessa espera nem sei de quê.
Envolvo-me no cobertor de lã lilás... As pipocas e o chocolate quente parecem me aconchegar.
Ao longe avisto as cores dos semáforos piscando solitariamente para poucos aventureiros noturnos.
O sino da igreja está silencioso.
O caminhão do gás dorme e permite o sossego aos ouvidos carentes de um piano solo.
Gostaria de ser resgatada como uma Rapunzel.
Seria o canto do galo esse que escuto agora?
Noite imensa, longa como os acordes de Pavarotti...
“Nessum dorma”...

 
 
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