DOMINGO É DIA DE CONVERSA FIADA...
Djanira Luz
 
 

Barulho de panelas na cozinha, alguém deixou cair um talher; crianças correndo a gritar pela casa; é o Pedro querendo jogar um grilo na cabeça da prima Sílvia, esses meninos... A vó ri, a mãe reclama, o pai vai atrás.

Num domingo, de sol ou de chuva, a gente reúne a família na casa dos meus avós para o almoço de fim de semana.

Domingo é assim: gritos, risadas, barulhos, alegria e cheiros invadindo a casa denunciando o menu do dia: arroz primavera, rosbife com creme de mandioquinha, pernil assado, polenta, salada com azeite e vinagre. E para sobremesa, torta gelada de abacaxi da tia Zita! E tem a mesa farta de frutas com melancia, abacaxi, laranja, melão, manga, morango. Mamãe diz que é para quem não pode comer doce, mas eu bem que já ouvi dizer que é para seu Viriato que sempre exagera na bebida e depois tem que se entupir de frutas para curar a ressaca. Acho bom mesmo porque ele fica muito chato quando bebe demais, fala muita besteira. Outro dia até me chamou de Topo Gigio, poxa! Bem na frente de todo mundo. Até que tenho mesmo umas orelhas um pouco maior que o normal, mas ele não precisava ter falado daquele jeito. Ainda hoje, revejo a cena dele gritando apontando para mim:

- Com vocês, o milenar... Toooooooooooopo Gigio! Berrou cambaleante o padrinho do tio Bruno. E começou a cantar "meu limão, meu limoeiro, meu pé..." de não sei o quê!

O palhaço do primo Pedro, aquele capeta, quase se mijou de rir... Agora quando o seu Viriato começa a ficar meio ou por inteiro tonto, fujo da frente dele. Deixo que ele faça uma outra vítima, eu nunca mais!

Num canto da sala, perto da escrivaninha, alheios aos barulhos, os primos Aldo e João disputam, silenciosamente, uma partida de xadrez. Sisudos, compenetradíssimos.

Antes do almoço toda a família se reúne para cantar várias músicas. Vovó escolhe umas bem antigas. De tanto que ela pede para cantar, até aprendi a letra e também a gostar. Minha tia Zita, pede sertaneja para alegrar o marido mineiro. Haja moda de viola para a gente decorar! Teve um tempo que eu escolhia umas músicas Pop Rock, mas a velhada me olhava feio que até desisti.

Na hora da cantoria, a gente se diverte bastante e parece até que a fome aumenta. Quando a barriga de alguém ronca, vovô ri e diz que a campainha está tocando porque é hora de ir almoçar. Tem dias que eu torço para que alguma barriga ronque logo para eu comer mais cedo.

Nada poderia ser mais perfeito para um domingo. A música suave ao fundo, alguém ao piano toca Beethoven. É Ana, a neta que é motivo de orgulho e alegria para a família. Até os passarinhos aguçam mais o canto quando ouvem os primeiros acordes de Pour Elise.

Tudo é sempre bom na casa dos meus avós. Comida, brincadeiras, cheiros, até mesmo o barulho da bagunça. Mas nada supera a conversa da família depois da refeição. Nada de conversa séria, de broncas, de conselhos, de cobranças. Só mesmo aquela conversa em que a gente fica sabendo como foi a semana dos parentes que só encontramos no domingo na casa da vó Maria. Uma conversa à toa; uma conversa boa, gostosa.

E, para mim, não existe nada melhor do que estar com quem se ama e passar um tempo assim, com uma conversa fiada...